Governo dos Açores - Secretaria Regional da Educação, Ciência e Cultura - Direção Regional da Cultura

urzela

História Possivelmente devido à relevância histórica do pastel na economia das ilhas dos Açores até meados do século XVII, a urzela (Rocella tinctoria, Ach.), tintureira produzindo uma coloração castanha suave, ocupou sempre lugar secundário. Florescia de modo espontâneo nalgumas ilhas, sobretudo em Santa Maria, Graciosa, S. Jorge e Flores, nas rochas junto à orla marítima, envolvendo a sua apanha, nalguns locais mais inacessíveis, algum risco. Gaspar Frutuoso, ao descrever a ilha de Santa Maria, e ao aludir à excelência e valor da urzela, refere um local onde «se apanha muita urzela, que é como musgo do mar, e de cor cinzenta, e deita de si tinta azul mais fina que a do pastel; nasce ali nas rochas, junto do mar, cuja granjeira é muito trabalhosa e de muito perigo, porque, dependurados em trinta a quarenta, cinquenta braças de corda, os homens as andam apanhando e morrem muitos deles, caindo pelas rochas». Ao tratar da descrição da ilha Graciosa aponta idênticos perigos. Da sua real importância atesta a toponímia, assinalando-se lugares como a Malbusca e a Urzelina, respectivamente nas ilhas de Santa Maria e S. Jorge.

Apesar da maior importância do pastel, a apanha da urzela processou-se desde data recuada, havendo notícias de colheita de quantidades significativas na década de 90 do século XV. Ultrapassado o chamado «ciclo do pastel» devido ao aparecimento de produtos de maior rentabilidade e menor preço, a urzela manteve a procura e as populações permaneceram activas na sua apanha e, também, no seu contrabando, já que a coroa detinha o exclusivo da comercialização. No período de capitania-geral instituída em 1766, é notória a preocupação da Junta da Fazenda em controlar a saída da urzela muito procurada por navios ingleses, facto que não se estranhará se recordarmos que já em Frutuoso se faz referência explícita a «um ingrês, que havia já vindo à ilha [Santa Maria] a comprar urzela». O envolvimento da Junta da Fazenda dos Açores na satisfação do serviço da dívida de £ 600.000, contraída pela corte portuguesa em Londres no ano de 1809, para além da transferência de todas as sobras das rendas reais cobradas no arquipélago dos Açores, implicava uma rigorosa concentração em Angra de toda a produção de urzela recolhida nas ilhas onde era apanhada, para envio com destino a Inglaterra, revertendo o seu valor ali transaccionado para amortizar a referida dívida. Para que se faça ideia do valor comercial envolvido na época, refira-se que entre os anos de 1809 e 1819 a urzela exportada para Inglaterra alcançou valores muito significativos na ordem dos 1.300 quintais. Ainda no ano de 1831, no n.º 37 de 23 de Janeiro da Chronica da Terceira, se encontra anúncio de Ricardo Dart informando o público ser comprador da dita planta pelo melhor preço. Ricardo Manuel Madruga da Costa

Bibl. Arquivo dos Açores (1980). Ponta Delgada, Universidade dos Açores, I, XII. Costa, F. C. (1947), A urzela. [Palestra radiofónica lida a 24 de Outubro de 1947, em texto dactilografado, Ponta Delgada, Serviços de Documentação da Universidade dos Açores]. Costa, F. C. (1984), Dicionário de História de Portugal. Porto, Livraria Figueirinhas, IV. Frutuoso, G. (1971), Livro Terceiro das Saudades da Terra. Ponta Delgada, Instituto Cultural de Ponta Delgada. Lima, M. (1940), Anais do Município da Horta. Famalicão, Oficinas Minerva.