Governo dos Açores - Secretaria Regional da Educação, Ciência e Cultura - Direção Regional da Cultura

Flores (ilha das)

Geografia Humana

1 ? Colonização e evolução

O achamento da ilha das Flores, inicialmente designada de S. Tomás ou de ilha Conilgli (ilha dos Coelhos) deu-se mais tarde que o das ilhas dos grupos Central e Oriental, sendo também por isso mais tardiamente povoada. De facto, embora haja notícia de que em 1452 já possuía capitão designado, Diogo de Teive seu «achador», sabe-se que em 1507 ainda não era habitada «por ser a terra mui fragosa».

Uma das primeiras tentativas de povoamento terá ficado a dever-se ao flamengo Wilhelm van der Hagen (que mais tarde adoptaria o nome de Guilherme da Silveira), o qual depois de estabelecido o necessário acordo com D. Maria de Vilhena, então administradora da ilha (cargo desempenhado em representação do donatário e seu filho menor Rui Teles de Menezes), saiu do lugar do Topo na ilha de S. Jorge, com a família e criadagem com o intuito de dar início ao processo de ocupação humana. Mas, por razões que se desconhecem verdadeiramente, porventura porque os potenciais de cultivo não agradavam ou, porque a ilha era demasiado distante das restantes e do continente, a experiência não duraria mais do que uma dezena de anos, terminando com o regresso da família Silveira ao lugar de origem. Gaspar Frutuoso escreve que Guilherme da Silveira se estabeleceu na zona de Ribeiro da Cruz «onde ali fez uns edifícios e casas bem lavradas, para morar, em uma furna, onde ainda estão, e como não achou a terra a seu gosto se passou a S. Jorge».

Melhor sorte terá tido a tentativa promovida pelo então capitão Pêro da Fonseca (filho de João da Fonseca, natural de Évora, para quem, em 1504, passara a posse da capitania da ilha) que, em 1528, liderou um grupo de colonos que se veio a fixar em definitivo na ilha, sob a protecção de S. Pedro, a quem foi dedicada a primeira ermida. Provavelmente, estes novos e primeiros colonizadores efectivos terão vindo das ilhas Terceira e de S. Miguel e das regiões do continente Alentejo e Ribatejo, tendo-se as famílias dispersado por diversos locais da ilha. Tese que alguns autores vêm confirmada na própria toponímia das Flores (Fajãs de Lopo Vaz, Fajã Verde e dos ilhéus de Álvaro Rodrigues, ?).

Mas, o título de maiores impulsionadores do povoamento da ilha é habitualmente concedido aos condes da vila de Santa Cruz (título atribuído pela primeira vez em 1593 a D. Fernando de Mascarenhas, por D. Filipe I). Efectivamente, os Mascarenhas, que viriam ainda a usar os títulos de Marqueses de Gouveia e de Duques de Aveiro, deram grande impulso à colonização das Flores, sobretudo a partir dos séculos XVII. Mais tarde, no entanto, os Mascarenhas seriam acusados e justiçados em Belém como instigadores de conspiração contra o D. José I e, em consequência de tal facto, dar-se-ia a extinção da «Casa de Aveiro» e a passagem dos bens destas, incluindo a ilha das Flores, para a posse da Coroa portuguesa.

Tomando como referência os termos do contrato celebrado pela Coroa com um tal Pedro José Caupers (moço da guarda-roupa do príncipe D. João, que no primeiro quartel do século XIX afora por três vidas os bens confiscados ao Duque de Aveiro na ilha das Flores), podemos afirmar que o sustento dos habitantes da ilha das Flores advinha essencialmente da produção de trigo, da pecuária ovina e da produção de panos de lã. Efectivamente, no contrato com o novo donatário da ilha, fica estabelecido a obrigação deste pagar anualmente «três móios de trigo e sessenta varas de pano de lã aos religiosos do convento de S. Boaventura e quarenta alqueires de trigo a cada um dos carcereiros das cadeias das vilas de Santa Cruz e das Lajes».

2 ? Demografia e estrutura do povoamento

A ilha das Flores foi desde sempre pouco povoada, tendo atingido o seu máximo populacional, cerca de 9,5 milhares de habitantes, nos inícios da década de cinquenta. Desde então, e a exemplo das restantes ilhas do arquipélago açoriano, acentuaram-se os fluxos emigratórios, sobretudo para a América do Norte e o continente, mas também para as ilhas maiores e mais dinâmicas da região ? S. Miguel e Terceira. Note-se que esta última, já no início dos anos quarenta, tinha sido destino de um razoável contingente de trabalhadores oriundos das Flores para as obras de construção do aeroporto das Lajes (cf. figura 1).

Logo nas décadas de cinquenta e sessenta, a ilha registou taxas de emigração da ordem dos 12 a 16% mas, foi no decurso da década de setenta, quando tais taxas atingiram os 23,3%, que o fenómeno emigratório alcançou expressão de enorme preocupação e fragilização das estruturas demográficas locais.

A desvitalização da pirâmide etária está bem patente no facto de, entre 1950 e 2001, o peso da população jovem com menos de 14 anos se ter reduzido de 28,9% para 16,9% e, de, no mesmo período, o peso da população idosa com mais de 64 anos, ter mais do que duplicado, passando de 7,1% para 17,9%. Como resultado de tal processo de envelhecimento, as taxas de natalidade (que tradicionalmente sempre foram mais baixas que a média da região) declinaram progressivamente, passando de valores superiores a 20?, na década de cinquenta, para valores da ordem dos 11?, na actualidade. Uma vez que desde inícios da década de oitenta se verifica que as taxas de mortalidade prevalecem sobre as de natalidade, conclui-se que desde há mais de duas décadas que a ilha das Flores não consegue assegurar a regeneração natural da sua população (note-se que na última década a taxa de excedentes de vida foi de ? 4,6 ?). A agravar tal situação está, como já se sublinhou anteriormente, o facto de as taxas de emigração se manterem positivas (2,2? na última década) (cf. figuras 2 e 3).

No que se refere ao sistema de povoamento, as Flores, a exemplo de outras ilhas açorianas, por serem fisiograficamente uma montanha de origem vulcânica, apresentam um padrão de linha costeira de assentamentos populacionais, o que se compreende visto ser junto à costa que o relevo se suaviza, ora através da maior abertura dos pequenos vales ou da emergência de pequenos terraços, além de que a proximidade ao mar foi desde sempre um factor de grande importância.

Se bem que se tenha assistido a um processo generalizado de desvitalização dos aglomerados das Flores, é interessante registar o facto de ao longo do século XX não se terem verificado grandes alterações na estrutura de povoamento da ilha. Efectivamente, a hierarquização dos lugares manteve-se sensivelmente a mesma, bem como o número de lugares com mais de 50 habitantes, os quais não chegam a duas dezenas. Os aglomerados de Santa Cruz das Flores (860 habitantes, em 2001, mas é de realçar que, em 1911, chegou a ter 2.032 habitantes) e de Lajes das Flores (524 habitantes, em 2001), ambos sedes de concelho, continuam a ser, sob os vários pontos de vista, como o demográfico e o económico, os mais importantes da ilha (cf. figuras 4A e 4B).

Globalmente, a ocupação do território da ilha das Flores é marcada pelas paisagens agro-naturais, sendo de registar que os matos ocupam quase metade da superfície das Flores (49,3%, correspondentes a 6.943 hectares) e que os espaços agrícolas representam quase outro tanto (46,1%, correspondentes a 6.496 hectares). A floresta de produção representa apenas 2,9% da superfície da ilha, os espaços urbanos 1,7% e os espaços industriais quase que não têm significado estatístico (0,01%, ou seja 0,9 hectares) (cf. figura 5).

3 ? Base económica e emprego

A base económica das Flores é uma das mais debilitadas da região, estando apenas registadas 25 empresas, das quais 22 na vila de Santa Cruz e 3 na vila das Lages, o que no conjunto representa apenas cerca de 1% do tecido empresarial açoriano. Confirmando tal debilidade está também o facto de a maioria destas empresas ter facturações anuais abaixo dos 500 mil euros, havendo apenas uma que factura acima dos 3 milhões de euros.

Efectivamente, até aos anos setenta a economia local assentou essencialmente numa agricultura familiar, fundamentalmente de subsistência, onde pontificava a produção de milho e de pastagens e a pecuária bovina leiteira. A pesca, sobretudo enquanto foi possível pelas leis nacionais e internacionais a «caça» à baleia, teve também significativa importância. Se bem que menos conhecida, a difícil e arrojada tarefa de apanha de algas dos fundos do mar chegou a ter alguma relevância económica.

Desde então, o sector primário perdeu muito da sua tradicional representatividade. De facto, é cada vez mais um sector residual em termos de ocupação da população activa, tendo passado de um peso de 61,9% em 1970, para apenas 15,6% em 2001. Hoje em dia, são apenas semeados cerca de 70 hectares, ou seja 3,7 vezes menos do que no início da década de noventa) e, as principais produções agrícolas da ilha assentam no milho (em 2002, foram semeados 42,8 hectares, atingindo-se uma produção de 325,2 toneladas, das quais 110,6 de milho-grão e 214,6 de milho forragem; mas note-se que há dez a doze anos atrás a produção deste cereal era mais do dobro) e na batata (26,1 hectares semeados de batata «do Cedo» e de batata «do Tarde», que deram uma produção de 443,8 toneladas). A produção de leite das Flores (que embora oscilando anualmente tende a rondar os 900 mil a 1 milhão de litros), tem alguma importância para a ilha, mas é insignificante ao nível regional, representando menos de 1,8% do total alcançado no arquipélago.

No sector da pesca, que continua a manter um carácter bastante artesanal, apenas tem algum relevo o atum e similares, mas ainda assim, nos portos das Flores não têm sido descarregados nos últimos anos mais do que 2 a 3 toneladas de pescado (0,2% do total descarregado nos portos do arquipélago).

Em contrapartida, de 1970 aos nossos dias, o sector terciário evoluiu de apenas 29,7% para 60,7%, sendo por isso hoje a principal força motriz da base económica da ilha. Mas, também se deve sublinhar que grande parte deste fenómeno de terciarização assenta em emprego na administração e serviços públicos.

A indústria, ainda que basicamente associada à produção de lacticínios, tem vindo a ganhar alguma representatividade, a ponto de já mobilizar quase 24% do emprego (cf. figura 6).

É, certamente, no desenvolvimento do turismo, que ultimamente se tem vindo a fundar expectativas para uma maior desencravamento da base económica local. De facto, face à progressiva afirmação da actividade turística nos Açores, começam a desenhar-se horizontes alternativos de maior sustentação da base económica das Flores, tanto mais que a sua paisagem oferece trechos de grande beleza cénica, como as áreas das antigas caldeiras vulcânicas, hoje belas lagoas como a Caldeira Comprida e a Caldeira da Água Branca, ou a área costeira, quase sempre alcantilada e, aqui e ali, ponteada de furnas de grande interesse turístico como a dos Enxaréus, nas proximidades de Santa Cruz das Flores.

4 ? Infra-estrutração e condições de vida

O quadro de vida da população das Flores melhorou substancialmente nas últimas décadas, muito pelo voluntarismo das duas autarquias locais (Santa Cruz das Flores e Lajes das Flores) e, sobretudo, devido aos apoios ao investimento público disponibilizados pela União Europeia. Apesar disso, a ilha das Flores continua a apresentar ao nível da infra-estruturação básica e dos equipamentos colectivos de âmbito social e cultural um conjunto de carências limitativas de um quadro de vida atractivo à fixação populacional. Mas, também se deve referir que o desenvolvimento das redes de equipamentos e serviços colectivos está à partida bastante condicionada pelo facto de a ilha apresentar limiares populacionais muitos escassos e impeditivos de rendibilização de alguns investimentos.

Ao nível da infra-estruturação básica, um dos aspectos que já atingiu níveis de cobertura satisfatórios é o do abastecimento domiciliário de água, na medida em que, hoje em dia, a quase totalidade dos alojamentos da ilha já dispõe desta facilidade (note-se que, em 1981, ainda restavam 21,1% de alojamentos sem acesso a abastecimento domiciliário de água). Ao invés, no domínio dos esgotos, o problema está longe de estar satisfatoriamente resolvido, pois de acordo com os dados disponibilizados no Censo de 2001, verificamos que apenas 7,2% dos alojamentos das Flores estavam ligados à rede pública de esgotos. No entanto, tal não significa que a maioria das habitações não disponha de instalações sanitárias, já que grande parte desfruta de fossa séptica particular (85%). A energia eléctrica, cuja implantação é mais fácil e menos onerosa, está presente em todos os alojamentos desde a primeira metade da década de noventa.

No campo da saúde, a ilha, dada a sua reduzida dimensão demográfica, não dispõe de qualquer unidade hospitalar, tendo por isso os seus habitantes de recorrer aos serviços prestados no hospital distrital da Horta. Por forma a suprir as necessidades de internamento em caso de convalescença, as Flores possuem uma pequena unidade de internamento (19 camas) associada ao Centro de Saúde localizado em Santa Cruz. Ao nível dos cuidados de saúde primários, a oferta pública estrutura-se em torno do Centro de Saúde de Santa Cruz e das seis extensões que este integra. Como recursos humanos, a rede pública de saúde dispõe apenas de 3 médicos e 9 técnicos de enfermagem. Em 2001, o número de internamentos elevou-se a 290 (com cerca de 876 dias de internamento) e o número de consultas a 9,9 milhares (67% das quais relacionadas com clínica geral). A ilha dispõe igualmente de uma farmácia e um posto de venda de medicamentos (cf. Quadro 1).

Outro sector social de extrema importância para a população das Flores é o da educação. Aqui, a ilha consegue satisfazer as procuras existentes até ao nível do ensino secundário, até porque dado o processo de envelhecimento demográfico verificado, estas são cada vez mais reduzidas. A educação pré-escolar está presente nos dois concelhos da ilha ? Santa Cruz e Lajes, qualquer um deles usufruindo de 3 estabelecimentos, sendo 2 públicos e 1 privado, abrangendo no total cerca de 100 crianças e envolvendo 10 educadoras. O primeiro ciclo do ensino básico integra 8 estabelecimentos, repartidos de igual modo pelos dois concelhos, sendo frequentado por cerca de duas centenas de alunos, distribuídos por 20 docentes. Já os níveis seguintes do ensino básico obrigatório (2.º e 3.º ciclos, que em 2001 tinham, respectivamente, 115 e 168 alunos) e o ensino secundário (152 alunos) estão apenas disponíveis num estabelecimento sediado na vila de Santa Cruz.

Por último, referência à oferta de equipamentos e serviços culturais, a qual é igualmente bastante limitada, sustentando-se apenas num pequeno museu e numa biblioteca (com cerca de 7,7 milhares de documentos), à qual, em 2001, acorreram 4.500 utilizadores. José Manuel Simões

 

GEOLOGIA

A ilha das Flores localiza-se geologicamente na placa tectónica americana, ou seja a oeste do rifte médio atlântico. Como todas as ilhas do arquipélago trata-se de uma estrutura vulcânica edificada a partir do fundo oceânico, que, neste local, tem cerca de 10 Ma (milhões de anos). O edifício insular eleva-se dos 1500 m de profundidade até 915 m acima do nível do mar (Morro Alto), apresentando, portanto, altura de quase 2500 m. A base da edificação vulcânica apresenta cerca de 45 km de largura na direcção E-W e alongamento de cerca de 75 km segundo a direcção N-S. A partir do mesmo edifício eleva-se a ilha do Corvo. A porção emersa corresponde a cerca de 8% do volume total do vulcão e apresenta uma área de cerca de 143 km2 (Azevedo, 1998).

A ilha apresenta uma planta aproximadamente elíptica com dimensões de 16 km (segundo a direcção de alongamento N-S) por 11,5 km (largura E-W). As arribas são predominantemente alcantiladas, destacando-se o traçado rectilíneo e orientação E-W dos troços da costa norte entre Ponta Delgada e a Ponta do Albernaz e da costa sul do Lagedo até às Lajes; estes litorais rectilíneos correspondem provavelmente a controle tectónico por falhas transformantes relacionadas com o rifte, contrastando claramente com as costas leste e oeste mais recortadas. Merece referência particular a Fajã Grande, na costa ocidental da ilha, que resultou de vários e volumosos colapsos gravíticos da arriba litoral. A fajã apresenta dois patamares que se desenvolvem a cotas distintas (69-70 m e 250-280 m), suporta alguns aparelhos vulcânicos e respectivos derrames lávicos edificados sobre aquelas superfícies após os episódios de desmoronamento, e é limitada interiormente por imponente arriba cujo topo se situa a altitudes que oscilam entre 670 e 350 m. O interior da ilha caracteriza-se por uma morfologia quase planáltica, mais ou menos dissecada pela incisão fluvial e pontuada por crateras freatomagmáticas ou cones piroclásticos. Esta região desenvolve-se maioritariamente a altitudes entre os 300 e os 900 m.

Azevedo (1998) distingue nas Flores duas grandes sequências vulcânicas: o Complexo de Base, que inclui as formações vulcânicas associadas à fase submarina e emergente da actividade eruptiva, e o Complexo Superior, onde agrupa as formações eruptivas subaéreas relacionadas com o vulcanismo da fase emersa. Do ponto de vista geocronológico, as datações disponíveis (Azevedo, 1990; Azevedo et al., 1986, 1991; Azevedo e Portugal-Ferreira, 1995) indicam para o Complexo de Base idades entre mais de 2,5 Ma (milhões de anos) e aproximadamente 700 mil anos. No Complexo Superior as datações efectuadas forneceram idades que variam entre 670 mil anos e 3 mil anos (Morisseau e Traineau, 1985; Azevedo, 1998).

Cada um dos complexos vulcânicos foi dividido em unidades e sub-unidades representativas de fases eruptivas apresentando características particulares ou que se encontram separadas por episódios erosivos com significado na escala da ilha.

O Complexo de Base, que constitui o substrato da ilha representativo da sua fase de emersão, aflora apenas nas arribas litorais das costa leste e oeste. No interior da ilha e no litoral norte e sul esta sequência encontra-se coberta pelos materiais mais recentes do Complexo Superior.

O Complexo de Base foi subdividido em duas unidades, Unidade Inferior (com duas sub-unidades) e Unidade Superior (com três sub-unidades), separadas com base na polaridade magnética (inversa na Unidade Inferior e normal na Unidade Superior) apresentada pelos materiais vulcânicos que os constituem, representativas de uma inversão da polaridade magnética da Terra ocorrida há cerca de 1,8 Ma (Azevedo, 1998). Estes produtos apresentam características que indicam emissão em ambiente submarino, sendo constituídos maioritariamente (cerca de 70%) por materiais brechificados e piroclastos que indicam predomínio de manifestações vulcânicas explosivas, a que se associam derrames lávicos, localmente sob a forma de pillow lavas. As rochas vulcânicas constituintes do Complexo de Base apresentam natureza basáltica e havaítica. Estes produtos vulcânicos encontram-se atravessados por numerosos filões basálticos e traquíticos, parte importante dos quais corresponde às condutas que alimentaram o vulcanismo do Complexo Superior.

No Complexo Superior, que representa a fase vulcânica que se sucedeu à emersão da ilha, foram definidas por Azevedo (1998) três unidades: Unidade Inferior (com 4 sub-unidades), Unidade Intermédia (com duas sub-unidades) e Unidade Superior (com duas sub-unidades).

A Unidade Inferior do Complexo Superior constitui o volume principal da parte emersa da ilha. Por se encontrar parcialmente coberta pelos produtos da Unidades Intermédia e Superior aflora predominantemente nas arribas litorais e nos vales que recortam mais profundamente a superfície planáltica da ilha. As quatro sub-unidades em que se encontra dividida representam uma evolução geoquímica dos magmas ao longo do tempo (desde há 670 até há 540 mil anos) dos basaltos, menos evoluídos, da sub-unidade mais antiga até às composições traquíticas mais recentes, passando por produtos de natureza havaítica, mugearítica e benmoreítica. Esta unidade é formada por um empilhamento de derrames lávicos, alternando com intercalações piroclásticas volumétricamente menos importantes, que representam uma fase de vulcanismo predominantemente efusivo. À parte superior desta fase pertencem alguns picos proeminentes e espessas escoadas lávicas de composição ácida e intermédia, tais como a chaminé exumada do Pico da Sé e a escoada havaítica-mugearítica onde se localiza a famosa Rocha dos Bordões. Aquele conhecido afloramento rochoso, ex-libris geológico da ilha das Flores, corresponde à exposição pelos agentes erosivos da estrutura interna da escoada lávica que se caracteriza por apresentar disjunção prismática muito bem desenvolvida.

A Unidade Intermédia do Complexo Superior, cuja actividade vulcânica se desenrolou há 400 a 220 mil anos, apresenta igualmente características essencialmente efusivas sendo constituída por derrames lávicos de natureza basáltica e havaítica a que se encontram associadas intercalações piroclásticas. Esta unidade aflora essencialmente nas áreas altas da ilha, onde se sobrepõe em discordância às rochas da Unidade Inferior e está coberta pelos materiais piroclásticos da Unidade Superior, mas também pode ser observada nas zonas litorais como sucede na Fajã Grande ou nas áreas de Santa Cruz e Ponta Delgada.

A fase final do vulcanismo do Complexo Superior, Unidade Superior, caracterizou-se por actividade eruptiva estromboliana e freática ou freatomagmática. A manifestação mais recente desta fase (Caldeira Comprida), datada pelo radiocarbono (Morisseau e Traineau, 1985), ocorreu há apenas 2900 ± 100 anos, não podendo, por conseguinte, considerar-se extinto o vulcanismo nas Flores. Esta fase de actividade eruptiva está representada por cones de escórias estrombolianos (Caldeira, Caldeira da Lomba, Caldeira Rasa, Monte das Cruzes, etc.), crateras de explosão freáticas ou freatomagmáticas (Caldeira da Água Branca, Caldeira Negra, Caldeira Seca, Caldeira Funda, etc.; veja-se, também, Caldeiras das Flores) e por uma cobertura generalizada de piroclastos finos. Associados à actividade estromboliana ocorrerão igualmente derrames lávicos. José Madeira

 

Bibl. Azevedo, J. M. (1990), Os depósitos vulcaniclásticos do Complexo de Base sudoeste da ilha das Flores: estrutura e ambiente de formação. Memórias e Notícias do Museu e Laboratório Mineralógico e Geológico da Universidade de Coimbra, 109: 35-63. Azevedo, J. M. (1998), Geologia e hidrogeologia da Ilha das Flores (Açores, Portugal). Tese de doutoramento, Universidade de Coimbra, 2 volumes e 1 Carta Geológica. Azevedo, J. M. e Portugal-Ferreira, M. R. (1995), As grandes formações vulcânicas da ilha das Flores, Açores. Memórias e Notícias do Museu e Laboratório Mineralógico e Geológico da Universidade do Porto, 4: 967-969. Azevedo, J. M.; Portugal Ferreira, M. R. e Martins, J. A. (1986), O Complexo de Base da ilha das Flores, Açores. Memórias e Notícias do Museu e Laboratório Mineralógico e Geológico da Universidade de Coimbra, 101: 57-71. Azevedo, J. M.; Portugal Ferreira, M. R. e Martins, J. A. (1991), The emergent volcanism of Flores Island, Azores (Portugal). Arquipélago (série Ciências da Natureza), 9: 37-46. Morisseau, M. e Traineau, H. (1985), Volcanologie ? Mise en évidence d?une activité hydromagmatique holocéne sur l?Ile de Flores (Açores). Comptes Rendues de la Academie des Sciences de Paris t, (II) 301, 18: 1309-1314.