Governo dos Açores - Secretaria Regional da Educação, Ciência e Cultura - Direção Regional da Cultura

Ponta Delgada (concelho)

Heráldica Apesar do esforço de Manuel Ferreira no seu estudo sobre Ponta Delgada ? a História e o armorial, os primitivos símbolos heráldicos e a sua evolução continuam por desvendar. Como ponto de partida, tem servido a pedra de armas existente na fachada da Câmara Municipal, ignorando-se a data da sua execução. Nela está inscrito, segundo a descrição de José Costa, «o escudo das armas nacionais, em estilo gótico, encimado pela coroa rematada pela Cruz da Ordem de Cristo. Aos lados, dois colunelos, com base e capitel simples, sustentando cada uma esfera armilar de ouro. À esquerda da Cruz (direita do observador) um sol de ouro, com 16 raios, e ao lado contrário um crescente também de ouro, apontando à parte superior da Cruz. Envolvendo o todo, duas colunas, com suas bases e capitéis, sustentando um arco manuelino, em cordão rematado no vértice, por um florão do mesmo estilo (um cardo, talvez). Dos capitéis das colunas saem brandões retorcidos, terminados por duas chamas de vermelho» (Ferreira, 1996: 63). Todavia, documentos do século XVI confirmam a presença de S. Sebastião na bandeira da cidade, na qualidade de padroeiro. Posteriormente, uma bandeira de 1821, em damasco de seda carmesim, com franja dourada a toda a volta, apresenta entre as armas nacionais e três setas de ouro entrelaçadas, não só a imagem de S. Sebastião, como a de Santo André. Com a implantação da República, a Câmara aprovou uma nova bandeira, tendo como base a pedra de armas já referida, retirando a coroa real, tendo por timbre três setas cruzadas em oblíqua, dirigindo-se da esquerda para a direita, e cruzando-se com uma palma, evocando as setas de flagelação do padroeiro. Acrescentou ainda as datas da passagem a vila (1499) e a cidade (1546). Anos depois, foi apresentada uma proposta por Afonso Dornelas que não agradou, pelo facto de apresentar cachos de laranja e dois ananases, encimado por um açor segurando nas garras as quinas de Portugal. Finalmente, em Outubro de 1946, foi definida a heráldica do concelho: Armas ? de vermelho, com um feixe de sete setas de ouro, enfeixadas, com os ferros apontados ao contra-chefe, atadas de prata; em chefe, um açor volante, de sua cor, com um escudete das quinas de Portugal nas garras. Selo ? redondo, com as peças do escudo soltas e sem indicação dos esmaltes, tendo à sua volta as palavras: Câmara Municipal de Ponta Delgada. Bandeira ? de amarelo tendo ao centro o escudo das armas, encimado por uma coroa de prata de cinco torres e listel de prata com os dizeres: Ponta Delgada, em caracteres de negro. A haste e a lança são douradas, os cordões e as borlas são de ouro e vermelho. Carlos Enes

 

Geografia O concelho de Ponta Delgada situa-se no extremo ocidental da ilha de S. Miguel. Confina a oriente com os concelhos da Lagoa e da Ribeira Grande e os restantes limites fazem fronteira com o Oceano Atlântico. Tem uma forma sensivelmente rectangular, com cerca de 234 Km2, valor que corresponde a 31,5 % da superfície insular. Em termos de divisão administrativa, o concelho é composto por 24 freguesias: Ajuda da Bretanha, Arrifes, Candelária, Capelas, Covoada, Fajã de Baixo, Fajã de Cima, Fenais da Luz, Feteiras, Ginetes, Livramento, Mosteiros, Pilar da Bretanha, Relva, Remédios, Santa Bárbara, Santo António, S. Roque, S. Vicente Ferreira, Sete Cidades, Santa Clara, S. José, S. Pedro e S. Sebastião. As últimas quatro integram a sede de concelho, a cidade de Ponta Delgada.

Do ponto de vista geológico, o território pertence ao Complexo Vulcânico das Sete Cidades (oeste) e ao Complexo dos Picos (este). A sismicidade desta área não é muito intensa, comparativamente à verificada na restante ilha, o mesmo não acontecendo com a elevada probabilidade de ocorrência de actividade vulcânica explosiva. Do ponto de vista orográfico, o concelho tem duas zonas distintas. A primeira é condicionada pelo imponente maciço das Sete Cidades, estrutura montanhosa com declives acentuados que culmina numa caldeira de grandes dimensões (cerca de 19 km2), o principal cartaz turístico dos Açores. A segunda é marcada pelo alinhamento perfeito de numerosos cones vulcânicos de pequena dimensão e bem conservados, associados a vulcanismo fissural. Esta unidade, designada Plataforma de Ponta Delgada ou Plataforma dos Picos, constitui a mais recente da ilha, onde dominam materiais permeáveis (escórias vulcânicas) pouco alterados. Os declives são suaves e as altitudes reduzidas (200-300 metros), o que justifica a forte implantação humana nesta parte da ilha.

A rede hidrográfica revela um padrão radial em torno do vulcão das Sete Cidades, sendo constituída por numerosas linhas de água de traçado rectilíneo e regime torrencial que correm em vales profundamente encaixados, conhecidas pela designação de grotas. Na Plataforma de Ponta Delgada a drenagem superficial é praticamente inexistente, devido à presença de solos permeáveis e aos declives suaves das vertentes. No maciço das Sete Cidades os condicionalismos edafoclimáticos determinaram a formação de muitas lagoas, sendo de destacar os espelhos de água existentes no interior da Caldeira: Lagoas Azul, Verde, Rasa e de Santiago. Muitas outras de menor importância encontram-se dispersas pelos pequenos cones vulcânicos que proliferam na Serra Devassa.

A linha de costa, com cerca de 86 Km, é caracterizada pela alternância de troços compostos por arribas altas e declivosas com outros que oferecem excelentes acessos ao mar. Como zonas balneares de referência salientam-se as piscinas naturais (poças) dos Mosteiros, de São Vicente Ferreira e dos Fenais da Luz. No entanto, são as praias do Pópulo e das Milícias, próximas de cidade de Ponta Delgada, que atraem um maior número de veraneantes. Refira-se ainda a Ponta da Ferraria pelas nascentes de águas termais que tornam a água do mar tépida, constituindo um local aprazível e muito procurado pelos banhistas, inclusive no período de Inverno.

O clima em Ponta Delgada é do tipo mesotérmico húmido com características oceânicas. As temperaturas médias anuais oscilam entre os 10 ºC nas regiões de maior altitude e os 17-18 ºC na costa sul, junto à sede de concelho. Quanto à precipitação anual, os valores podem superar os 2.800 mm nas Sete Cidades, enquanto que na costa sul, junto à cidade de Ponta Delgada, a pluviosidade não atinge os 1000 mm/ano. No que respeita à humidade relativa do ar, observam-se comportamentos idênticos, com registos na ordem dos 95-100 % nas áreas mais interiores e de maior altitude do concelho, ficando pelos 80-85 % nas imediações da costa.

Em termos paisagísticos, a Vista do Rei, situada na cumeeira da caldeira das Sete Cidades, é dos locais mais conhecidos dos Açores. Deste ponto obtém-se uma extraordinária panorâmica das lagoas das Sete Cidades, um cenário de rara beleza pela harmonia entre os elementos naturais e humanos. O miradouro da Ponta do Escalvado, local de paragem obrigatória, proporciona excelentes vistas dos Ilhéus dos Mosteiros e da Ponta da Ferraria. Do Pico do Carvão, na encosta do maciço das Sete Cidades, observa-se uma paisagem magnífica sobre a costa norte da ilha de S. Miguel.

Relativamente à conservação da natureza, o concelho de Ponta Delgada inclui o Monumento Natural Regional do Pico das Camarinhas e Ponta da Ferraria e a Paisagem Protegida das Sete Cidades, uma das primeiras áreas classificadas da Região Autónoma dos Açores com estatuto de protecção.

Quanto à ocupação humana, desde o início do último século, a população residente apresentou um crescimento contínuo até 1960, data em que registou o efectivo máximo de 74.306 habitantes. Após esse período, verificou-se um decréscimo populacional contínuo até 1991 ainda que pouco acentuado. No entanto, os valores apurados no XIV Recenseamento Geral da População de 2001 (INE, 2002) demonstraram o reinício de uma fase de crescimento populacional. Em 2001, o concelho de Ponta Delgada detinha 65.854 habitantes, o que corresponde a uma densidade populacional de 281 hab/Km2, valor significativamente superior à média regional (103,8 hab/Km2). Note-se que 50 % e 28 % da população da ilha de S. Miguel e da Região Autónoma dos Açores, respectivamente, reside no concelho, sendo, portanto, detentor do maior potencial demográfico de todo o arquipélago. É também o município da região com maior número de freguesias, muito embora a distribuição da população seja francamente desigual a este nível administrativo. Na verdade, as freguesias que compõem a cidade de Ponta Delgada (S. José, Santa Clara, S. Pedro e S. Sebastião), conjuntamente com as limítrofes (Fajã de Cima, Fajã de Baixo, Relva, Arrifes, Livramento e S. Roque), são as que possuem maior representatividade populacional em detrimento das freguesias rurais. Semelhante heterogeneidade ocorre também ao nível da maioria dos parâmetros socioeconómicos seguidamente descritos.

O número de famílias registado em 2001 foi de 18.595, distribuídas por 15.252 alojamentos familiares ocupados. Contudo, verifica-se alguma discrepância entre o número de alojamentos familiares existentes (18.894) e os ocupados, que correspondem apenas a 80%. Este dado indica que uma fatia significativa do parque habitacional é somente ocupada sazonalmente. A estrutura etária da população demonstra sinais de envelhecimento ao nível das faixas etárias mais baixas, nomeadamente entre os 0-9 anos, e uma preponderância dos indivíduos em idade activa. Note-se ainda que sobressai a predominância de idosos do sexo feminino sobre o masculino.

A taxa de analfabetismo, situada nos 7,6 %, é consideravelmente inferior à média registada para a ilha (10,3 %) e para a região (9,4 %), consequência da existência do pólo de Ponta Delgada da Universidade dos Açores e das crescentes exigências do mercado de trabalho da capital do arquipélago. No entanto, as freguesias rurais do concelho, mais afastadas da cidade de Ponta Delgada, chegam aos 13 % de analfabetos. Por sua vez, a taxa de actividade (44,4 %) é superior à média da ilha (41,7 %) e regional (42 %). A taxa de desemprego (6,7 %) tem um valor inferior ao assinalado para S. Miguel (7,7 %), embora seja ligeiramente superior à média regional (6,4 %). Destaque-se que na freguesia dos Mosteiros é atingido o valor máximo de 13 %.

Ao nível das principais actividades económicas, o concelho assume-se como o principal interface de entrada e saída de pessoas e mercadorias do arquipélago dos Açores. Sede do Governo Regional, constitui o principal centro de prestação de serviços do arquipélago, não só pela quantidade de bens produzidos e serviços disponibilizados, mas também pela sua diversidade e especialização. Os mais representativos são os serviços bancários, informáticos, de apoio a empresas, comerciais e os relacionados com a actividade turística. Em 2005, 6.521 empresas tinham sede no concelho, o que representava 50,4 % e 26,6 % da totalidade das empresas da ilha de S. Miguel e do arquipélago, respectivamente (SREA, 2006). Contudo, detém ainda um papel importante no sector industrial e na produção primária, particularmente a que está associada à agro-pecuária. As freguesias localizadas a poente são aquelas que concentram a maior produção a este nível económico.

Nas últimas décadas, o turismo surge com um sector de diversificação da base produtiva, existindo actualmente uma forte dinâmica de investimento dos agentes económicos. Em 2005, o município de Ponta Delgada possuía 30 estabelecimentos hoteleiros, dos quais 50 % eram hotéis, detendo uma capacidade de alojamento de 4.055 camas, o dobro do valor registado em 2001, o que representa 71,4 % e 36 % da capacidade de alojamento de S. Miguel e da Região Autónoma dos Açores, respectivamente.

Ao nível das principais infra-estruturas e equipamentos, o concelho dispõe de um aeroporto e porto internacionais, um museu, uma biblioteca pública, um centro de congressos, dois recintos de cinema, seis galerias de arte, um hospital dotado de valências regionais, um centro de saúde com 18 extensões e 13 farmácias (SREA, 2006), entre muitos outros equipamentos diversificados. Como principal pólo dinamizador dos Açores, a cidade de Ponta Delgada enfrenta novos desafios, nomeadamente com a requalificação em curso da frente marítima (cais de cruzeiros), com a revitalização do centro histórico e com a implementação de parques industriais periféricos que libertam espaço no tecido urbano para outros fins. João Mora Porteiro

 

História (séculos XV-XIX) A história do concelho de Ponta Delgada tem início no final do século XV, quando ocorreu a autonomização do lugar com aquele nome, com a outorga do foro de vila em 1499, por meio de diploma original que se perdeu, sendo a mercê objecto de posterior confirmação em 1507. Quais os motivos que conduziram a que Ponta Delgada fosse elevada a vila? Os acontecimentos que rodearam a outorga do novo estatuto foram narrados décadas depois por Gaspar Frutuoso (1981, II: 70-72) e a leitura do texto cronístico sugere, conforme defendemos já (Rodrigues, 1994), que o processo ficou a dever-se ao descontentamento daqueles que, morando em Ponta Delgada, eram obrigados a deslocar-se a Vila Franca do Campo, sendo «homens nobres e poderosos» (Frutuoso, 1981, II: 70). Deste modo, foram os valores dominantes na sociedade europeia pré-industrial, com a hierarquização dos corpos sociais em «estados» ou «ordens», que pesaram em 1499. Para os moradores principais de Ponta Delgada, entre os quais se contavam já um Fernão do Quental, aparentado com D. Filipa Coutinho, mulher do quinto capitão da ilha, Rui Gonçalves da Câmara, ou um Pero de Teve, filho do primeiro almoxarife, Gonçalo de Teve Paim, e irmão do segundo, João de Teve (Frutuoso, 1977, I: 85-86; Frutuoso, 1981, II: 71), a obrigatoriedade de irem a Vila Franca do Campo em ocasiões solenes constituía uma diminuição do seu estado, da sua honra. A partir de 1499, o concelho recém-criado, cujos limites precisos não são conhecidos, iniciou um processo de crescimento que implicou não só o confronto com poderes preexistentes mas, simultaneamente, um reforço da situação adquirida. Estamos perante um movimento de basculação em que Ponta Delgada assumiu, progressivamente, o lugar de «cabeça» da ilha, face à perda de importância da anterior sede do poder, Vila Franca do Campo. No plano da geografia política e administrativa, três momentos foram particularmente significativos: em 1515, os lugares de Feteiras, Mosteiros, Capelas e Fenais, até à data sob a jurisdição de Vila Franca do Campo, passaram a integrar o termo de Ponta Delgada, a pedido dos seus moradores; em 1518, por ordem régia, a alfândega da ilha de S. Miguel instalou-se em Ponta Delgada; e, por fim, em 1522, a subversão de Vila Franca do Campo destruiu qualquer veleidade da que fora a primeira vila micaelense poder disputar a hegemonia política e urbana a Ponta Delgada. A fixação de uma das mais importantes estruturas da administração periférica da coroa em Ponta Delgada, a alfândega, mais do que o desastre de 1522, assinalou o ponto final na pretensão de Vila Franca do Campo recuperar a posição cimeira que tinha sido a sua. A catástrofe sofrida mais não terá sido, neste contexto, do que o catalisador de um movimento que vinha de trás. Se o concelho de Ponta Delgada foi poupado pelo sismo de 1522, as suas gentes não escaparam a outro flagelo que se manifestou logo no ano seguinte: entre Julho de 1523 e Maio de 1531, a vila foi atingida pela peste de forma violenta, o que obrigou ao seu isolamento. Terminada a crise, o capitão Rui Gonçalves da Câmara declarou a vila desimpedida e os moradores, agradecidos, decidiram tomar S. Sebastião como seu patrono, ampliando e enriquecendo a respectiva igreja (Frutuoso, 1981, II: 334-340). D. João III não deixou de contribuir também para esse desígnio e, por alvará de mercê de 22 de Agosto de 1532, ordenou ao rendeiro das rendas das ilhas açorianas que, dos réditos arrecadados, desse 400 cruzados para ajuda das obras da igreja de S. Sebastião. A mercê foi concedida por quatro anos e o rendeiro deveria entregar cem cruzados cada ano, tendo o primeiro pagamento lugar em Outubro de 1532. O alvará de 29 de Agosto deste ano reforçou o empenho régio no progresso da vila, concedendo-lhe, por um prazo de doze anos, a imposição dos vinhos para custear as obras com a igreja, a fonte e o peitoril, direito que, mais tarde, seria desviado do fim inicial para suportar as despesas com a obra do forte de S. Brás. No que respeita ao crescimento urbano de Ponta Delgada ? também uma questão de prestígio ?, a conhecida e sempre citada expressão de Gaspar Frutuoso (1981, II: 70) dá-nos conta das fases de um movimento ininterrupto até ao final do século XVI: «primeiro foi solitário ermo, saudoso lugar e pobre aldeia, e depois pequena vila, a que agora é grande, rica, forte e tão afamada cidade». Embora sem as condições ideais, o porto de Ponta Delgada era palco de um movimento considerável e a população da então vila aumentou de tal modo que, em 1536, se dizia «nella aver mais jente que em todas as outras villas» (Arquivo dos Açores, 1981, IV: 55). Terão sido estas as condições que determinaram a mercê de D. João III, o qual, por carta de 2 de Abril de 1546, concedeu a Ponta Delgada foro de cidade (Arquivo dos Açores, 1980, I: 323-324). Com efeito, o texto da carta régia refere, de forma clara, que o rei decidiu conceder esse título de motu proprio e sem que lhe tivesse sido requerido pelos moradores da vila ou por outrem, considerando que «a villa de Pomte Dellgada da Ilha de Sam Miguell he agora tam acrecemtada em pouoação e asy nobrecyda, que merece bem ser cydade», mencionando ainda os serviços prestados pelos seus habitantes no apoio às naus da Índia que, ocasionalmente, fundeavam no seu porto e aqueles que lhe seriam prestados no futuro. Em suma, o critério decisivo terá sido o do volume populacional, sinal evidente do desenvolvimento urbano, e as funções desempenhadas no apoio às dinâmicas imperiais. Seguindo-se ao diploma de Abril, o alvará de 13 de Maio do mesmo ano reforçou a nova situação: os escrivães da câmara poderiam, de ora em diante, fazer um sinal público nos documentos que à mesma dissessem respeito. Ao nível do desenvolvimento urbano e no contexto nacional, no século XVI Ponta Delgada ombrearia com núcleos como Tavira e Coimbra, situando-se acima de Viana, Aveiro ou Estremoz. Em termos da malha urbana, a configuração espacial da cidade quinhentista definiu os eixos estruturantes do núcleo urbano que sobreviveram até à contemporaneidade. Tendo nascido numa baixa litorânea, Ponta Delgada cresceu ao longo da costa entre a Calheta de Pero de Teve, no seu extremo oriental, e o espaço popularmente conhecido, ainda hoje, como Campo de São Francisco, no limite ocidental, onde se ergue o mosteiro de Nossa Senhora da Esperança, inaugurado com nove freiras em 1541. A comunicação entre as duas áreas limítrofes da urbe fazia-se através de dois eixos longitudinais, um dos quais ? constituído pelas actuais ruas Marquês da Praia e Monforte, Machado dos Santos, de São João, do Mercado e do Peru e a Ladeira do Águas Quentes ? pode considerar-se como uma «rua Direita» interior, partindo do lado norte do Campo de São Francisco e vindo a alcançar, por fim, a Calheta. Como pólo organizador do núcleo urbano, a praça, em forma de L e aberta para o mar, onde se erguiam a Matriz, a câmara, o pelourinho, sobre o porto de duplo cais, e a casa da alfândega. A nordeste da praça, num seu prolongamento, encontrava-se a Misericórdia, possivelmente fundada em 1502 e demolida no século XIX. Este traçado permaneceu inalterado no essencial até meados de Oitocentos, sendo aquele que se encontra registado nas plantas de Ponta Delgada de 1814, incompleta, e de 1831, nas quais podemos observar como a malha urbana se apresentava bem definida na sua zona central e como a área da actual freguesia de S. Pedro correspondia ainda parcialmente aos arrabaldes da cidade. D. João III não concedeu a Ponta Delgada os privilégios que prometera na carta de elevação a cidade, mas em 1554, com a criação do cargo de juiz de fora, o monarca colocou a capital micaelense num plano único a nível do arquipélago, equiparando-a ao reduzido número de concelhos que tinham como magistrado judicial um oficial de carreira. Na história da cidade e do concelho, foi, sem dúvida, um marco institucional significativo. Esta medida surgiu numa conjuntura de alterações de monta no que respeita à orgânica institucional açoriana. A década de 1550 assistiu à entrada no arquipélago das companhias milicianas e ao implemento de medidas defensivas contra os ataques corsários, devido à importância estratégica das ilhas como escala de apoio à navegação, nacional e mesmo estrangeira (Rodrigues, 1998). Deste modo, na sequência de ataques de corsários a Ponta Delgada, no início dos anos de 1550, D. João III decidiu construir uma fortaleza que defendesse a cidade, ordenando, para isso, que o capitão de S. Miguel, Manuel da Câmara, então na corte, regressasse à ilha. Com ele, desembarcaram nos Mosteiros, em Dezembro de 1552, os responsáveis pela recolha da primeira parte das verbas destinadas às obras de edificação do castelo e pela organização e treino das companhias que se levantariam na ilha, respectivamente o corregedor Manuel Álvares e o sargento-mor João Fernandes da Grada (Frutuoso, 1981, II: 359-360). A nomeação do primeiro juiz de fora de Ponta Delgada, o licenciado Lourenço Correia, surgiu, pois, numa conjuntura precisa, sendo de notar que aquele oficial recebeu como encargo continuar a tarefa do corregedor Manuel Álvares e garantir a arrecadação do segundo terço da verba destinada a pagar a artilharia e as munições da fortaleza. Deveria, além disso, examinar os livros de registo do lançamento aplicado às obras e aquisição de material (Rodrigues 1994: 46-49). Claro que a construção de uma fortaleza em Ponta Delgada, como forma de combater o corso e proteger as embarcações, provocou necessariamente transformações na fisionomia da cidade e não decorreu sem problemas. O forte de S. Brás, de plano em estrela e figurino italianizante, foi construído entre 1552-1553 e o início dos anos de 1580. Não obstante o número crescente de moradores e a riqueza do concelho, que ocupava toda a zona ocidental da ilha, os rendimentos da câmara não seriam muitos, a crer nas palavras dos seus oficiais, e os custos com a edificação da fortaleza de S. Brás eram sentidos pela população em geral. Em consequência, em 1565 foi concedido à cidade que o direito da imposição, vigorando desde 1532 e desviado do seu fim inicial para suportar as despesas com a obra do forte, lhe pertenceria a partir dessa data, sendo os respectivos rendimentos aplicados apenas em igrejas e fontes. Para continuar a edificação do castelo seria lançado um novo pedido. Durante a construção da fortaleza, surgiram conflitos entre os frades de São Francisco e as freiras do mosteiro de Nossa Senhora da Esperança, de um lado, e os responsáveis pela obra, do outro: os trabalhos de fortificação da cidade atravessavam as cercas das duas casas conventuais, que se sentiam lesadas por isso. Também merece referência, no tocante ao impacto das obras de fortificação, a mudança da ermida de S. Brás para o local onde se encontra hoje, na actual rua Machado dos Santos, tranferência que ocorreu em 1584. Mas, apesar destas situações, em termos do ordenamento e da estruturação do espaço urbano, a influência do forte de S. Brás não se fez sentir aquando da sua construção, pois foi erguido sobre a praia, num dos extremos da cidade. No entanto, para o futuro, a fortaleza ficou como um dos principais símbolos da cidade. Data igualmente deste período (1575) a decisão de se edificar uma torre sineira na matriz de S. Sebastião. Todavia, inúmeros problemas, entre os quais o do financiamento da obra, impediram a sua conclusão, que teria lugar somente em 1624. Entretanto, como a população da urbe continuava a aumentar, cerca de 1580, o bispo D. Pedro de Castilho criou uma nova freguesia no limite ocidental da cidade, Santa Clara, tendo como paroquial a igreja de S. Mateus, pertencente aos capitães da ilha. Com a criação desta nova freguesia, na fronteira do espaço urbanizado de Ponta Delgada, zona suburbana ainda na segunda metade do século XVII, ficava completo o conjunto das paróquias em que se divide a cidade desde então. Já no período filipino, e dado que a «cabeça» da ilha nunca recebera os foros esperados desde a carta de 2 de Abril de 1546, talvez como forma de manifestar o seu apreço pela adesão de Ponta Delgada e da ilha de S. Miguel à sua causa, Filipe II outorgou à cidade os privilégios e as liberdades dos cidadãos do Porto, por carta de 12 de Dezembro de 1582. No ano seguinte, a carta régia de 17 de Junho concedeu a Rui Gonçalves da Câmara, capitão de S. Miguel, o título de conde de Vila Franca, título que beneficiava a casa dos Câmaras, reforçando o seu poder e prestígio, mas também enobrecia a cidade, que tinha agora, dentro dos seus limites, a casa de um titular. Ao findar o século XVI, o principal concelho de S. Miguel era também um dos mais ricos e populosos, com mais de dois mil e setecentos fogos em 1591, o que poderia corresponder a uns dez mil habitantes; quanto ao termo que a câmara administrava, as suas fronteiras, intocáveis até ao século XIX, estendiam-se desde os limites orientais do Livramento, na costa sul, aos Fenais da Luz ? Fenais de Rabo de Peixe, como então se dizia ? na costa norte. A jurisdição do senado fazia sentir-se sobre um amplo território e o corpo de oficiais camarários cuidava de defender a autoridade e o prestígio da câmara municipal, cujo edifício, a «casa da câmara», como é referido nos documentos dos séculos XVI-XVIII, era não apenas um dos mais importantes símbolos do poder concelhio, mas também a sede física desse poder. Por finais do século XVI, a «câmara velha» não apresentava já as necessárias condições para o normal funcionamento do senado camarário e foi substituída pela «câmara nova» ? o actual edifício ?, que funcionou como local das reuniões e centro do poder até ao século XIX, sofrendo graves danos na sequência do sismo de 16 de Abril de 1852. Na viragem de Quinhentos para Seiscentos, devemos destacar a instalação de duas ordens religiosas na cidade: primeiro, em 1591, os Jesuítas fixaram-se em Ponta Delgada, embora as suas casas de morada e a igreja fossem inauguradas somente em Fevereiro de 1593; depois, em 1606, chegaram os frades da Ordem de Santo Agostinho, que se mudariam para o convento de Nossa Senhora da Graça somente em 1618. No século XVII, na história do concelho, além das referências cronológicas já expostas, consideramos que merecem ser lembrados os motins de 1637-1638, anti-fiscais e que se integram na conjuntura de finais da União Ibérica, e os de 1643, 1647 e 1695, os «motins da fome» e que mobilizaram população do termo do concelho (Rodrigues, 1994: 314-317); os sismos de 1638, 1652 e 1682; e o surto de peste de 1673. Em relação ao primeiro sismo, sabemos que a partir de 26 de Junho de 1638 começaram a sentir-se sismos a ocidente, que se fizeram sentir por vários dias e obrigaram os habitantes do lugar da Várzea a abandonar as suas casas. A erupção teve lugar a 3 de Julho, no mar, ao largo da Ponta da Candelária. Os sismos de Outubro de 1652 foram sentidos sobretudo no eixo Ponta Delgada-Lagoa e, no que respeita ao primeiro concelho, terão sido as gentes de Rosto do Cão, freguesia de S. Roque, a sentir mais a violência dos tremores. Por fim, a erupção de Dezembro de 1682, que aconteceu no mar, ao largo da Ponta da Ferraria, sendo também sentida principalmente no concelho de Ponta Delgada, não parece ter provocado grandes danos. Estes sismos, bem como o surto de peste de 1673, apesar de perturbarem o ritmo de vida das populações, não terão sido de consequências nefastas para o crescimento demográfico da população da ilha e, em particular, a do concelho de Ponta Delgada. Em 1695, S. Miguel teria cerca de 34.000 almas (34.251) e 8.845 fogos, cabendo ao concelho da cidade pouco mais de 4.000 fogos (4.024) (Montalverne, 1961, II: 9, 20-21, 63, 239-240, 297-298, 353, 370, 385). Se as cifras de frei Agostinho de Montalverne estão correctas, Ponta Delgada tinha, na cidade e termo concelhio, cerca de 45% da população da ilha. Nos planos da administração religiosa e das estruturas militares, o aumento populacional teve correspondência na criação de novas jurisdições eclesiásticas (curatos) e na orgânica das companhias de ordenanças. Na cidade, o alvará de 6 de Junho de 1727 criou seis benefícios na igreja de S. José, com a côngrua de 24.000 réis cada um, atendendo ao crescimento da freguesia e, no ano seguinte, o alvará de 15 de Novembro criou o curato de Santa Clara, porque a freguesia de S. José tinha, já no ano de 1726, 708 fogos e 2.631 almas, sendo que 80 fogos e 278 almas no lugar de Santa Clara (Rodrigues, 2003, I: 212-213). Em 1770, o concelho de Ponta Delgada, o mais populoso da ilha, tinha pouco menos de 30.000 habitantes (28.512). No quadro da modesta geografia urbana de S. Miguel, Ponta Delgada destacava-se dos demais núcleos urbanos, mas, à escala europeia, continuava a ser uma cidade pequena (Rodrigues, I: 213 e 222-223). Em matéria de símbolos do poder, refiramos que em 1724, na vereação de 12 de Fevereiro, foi decidido construir uma torre junto ao edifício da câmara, pois a torre da Matriz, onde estava o relógio, estava arruinada e iria ser demolida. No campo da arquitectura civil, convirá destacar a dinâmica urbanística do período, bem mais intensa no concelho de Ponta Delgada do que no resto da ilha. Em 1721, ao descrever a cidade, Francisco Afonso de Chaves e Melo (1994 [1723]: 55), afirmou: «As casas estão muito reedificadas e a maior parte é feita ao estilo moderno de arquitectura». Além da construção ou readaptação de muitas casas nobres em Ponta Delgada, também as quintas existentes em redor da cidade ou no hinterland rural do concelho foram sendo reconvertidas em casas de campo e certas zonas, como Capelas, transformaram-se em centros de veraneio. De entre os vários exemplos possíveis, citemos, na zona das Capelas, as quintas de Nossa Senhora da Piedade, situada perto do morro daquele lugar e residência de Manuel Álvares Cabral Brum da Silveira, da governança da cidade, a de Santana, pertença, em finais do século XVIII, da mesma família (Álvares Cabral), a de Santa Rita, propriedade do tenente Bernardo António de Melo, e a do Rosário, do capitão João do Couto de Viveiros; na Fajã [de Baixo], a quinta de Nossa Senhora do Loreto, com uma ermida daquela invocação, posterior a 1699, mas já concluída e paramentada em 1716; na zona da Abelheira, acima da Fajã [de Baixo], as quintas do Bonfim, do Bom Sucesso, de São João, de Santa Rosa de Viterbo, de Santa Teresa e da Senhora da Rosa; e, no Livramento, as quintas de Nossa Senhora da Penha de França, cuja ermida fora edificada pelo capitão Francisco Lopes de Oliveira, a da Glória e a de Nossa Senhora das Necessidades, esta um magnífico exemplo de arquitectura senhorial (Rodrigues, 2003, II: 552-564). Na segunda metade do século XVIII, conforme foi já observado, a criação da Capitania-Geral em 1766 obedeceu, entre outros propósitos, ao objectivo de controlar os poderes periféricos. Todavia, o projecto do Conde de Oeiras falhou e as famílias dominantes que detinham o poder político e social mantiveram o controlo das instituições locais. No caso de Ponta Delgada, cuja plataforma era a área de produção por excelência da ilha, o círculo fidalgo da cidade fechou-se sobre si mesmo, monopolizando o poder. A edificação das Portas da Cidade, em 1783, não pode deixar de ser perspectivada como um símbolo do prestígio da elite fidalga que residia na cidade, reconhecida pelas vilas como capital da ilha. Apesar de alguma violência quotidiana, típica, aliás, de uma sociedade tradicional do Antigo Regime, o final do século XVIII foi, de um modo geral, pacífico e os saldos positivos apresentados pelo concelho nos anos de 1799 e 1800 sugerem que a administração municipal procurava combater eventuais excessos do passado. Em 1807, a invasão de Portugal pelo exército francês levou a corte portuguesa a instalar-se no Rio de Janeiro. Este marco representou um momento de viragem no Atlântico luso-brasileiro e deu início a uma série de medidas legislativas que visavam adaptar a arquitectura político-administrativa à nova realidade. Deste modo, os Açores e, no caso presente, Ponta Delgada entraram numa nova fase da sua história, que aceleraria após 1820. José Damião Rodrigues

 

Urbanismo O concelho de Ponta Delgada é um dos mais populosos dos Açores (cerca de 70.000 habitantes há um quarto de século), com mais de um terço da população total das ilhas. Abrange igualmente cerca da terça parte da área da ilha de S. Miguel, correspondendo a todo o sector ocidental, envolvendo a cratera das Sete Cidades, toda a costa e relevo envolventes e ainda uma parte da costa norte (até à Calheta, fronteira com o concelho da Ribeira Grande) e inclui o sector sul até ao Livramento (no limite com o concelho de Lagoa).

Podemos considerar a ocupação, pelos povoados desta área, agrupada em três tipos distintos:

                - o povoamento linear, ou em linha, ao longo do chamado «cordão litoral» viário, paralelo à costa e ligeiramente afastado desta, atravessando as sucessivas freguesias, desde a Relva, localizada na saída oeste da cidade de Ponta Delgada, passando pelos núcleos de Feteiras, Candelária, Ginetes, na costa sul, e na costa norte, pela Bretanha, Remédios, Santa Bárbara, Santo António, Capelas, Fenais da Luz e S. Vicente Ferreira; são povoações constituídas na maioria dos casos por uma rua-estrada estruturante, à qual se agregam travessas, ruas secundárias e canadas.

                - o povoamento envolvendo a cidade, na direcção do território interior desta, formando uma «coroa» no seu hinterland, com os núcleos das Fajãs (de Cima e de Baixo), os Arrifes e o Livramento;

                - o espaço urbano de Ponta Delgada, vila em 1499 e depois cidade em 1546, presentemente a maior cidade dos Açores.

Para além destes tipos de ocupação, ainda se podem mencionar duas excepções: uma fajã (designação dos pequenos núcleos de implantação costeira em terras baixas e rasas ao mar), a do Mosteiros (no extremo ocidental), e a povoação das Sete Cidades, espraiada junto à Lagoa do mesmo nome, no interior baixo da vasta caldeira.

Este tipo de povoados, urbanos e rurais, seguem em geral o modelo de ocupação territorial das ilhas, como já foi estudado (Fernandes, 1996) ? embora aqui com a dissonância provocada pela envolvência do crescimento urbano da «grande cidade» (grande à escala da ilha) de Ponta Delgada. Outra «mancha» especial, própria dos arredores desta cidade, desde o século XIX, é o constituído pelas inúmeras estufas de ananases, que emprestam um salpicado de branco a toda área das Fajãs, nos arredores norte-nascente da urbe.

 

A cidade de Ponta Delgada

Não constituindo a mais bela das cidades açóricas, Ponta Delgada tem mesmo assim uma personalidade sólida, alicerçada por séculos de história urbana e por uma arquitectura tradicional e específica, que lhe assegura o carácter.

A sua área central, desenvolvida à volta do modesto núcleo da Matriz de São Sebastião e da Câmara, em articulação com o antigo cais (ainda dentro de uma pequena escala, de desenho irregular, trans-medieval), estrutura-se ao longo do litoral, e é a ele paralelo, alongando o casario pela suave enseada virada a sul.

A primeira fase de crescimento da cidade, e até ainda como vila, deve ter correspondido a uma estrutura viária fusiforme de assentamento, com desenvolvimento linear, conformada pelas sequências dos seguintes dois eixos, um pelo lado litoral, o outro a norte do conjunto, e ambos estendidos de poente a nascente, entre os pólos de São José (antigo «rossio» de saída da povoação, com o forte de São Brás a sul) e da Calheta (zona mais pobre, piscatória e laboral):

- Praça 5 de Outubro (dos Franciscanos, S. José, e das Clarissas) / rua Luís S. de Sousa / rua do Açoriano Oriental / largo da República / largo da Matriz / rua dos Mercadores e rua da Misericórdia / rua Ernesto do Canto, até S. Pedro;

- Praça 5 de Outubro / rua Gil de Montalverne / rua Marquês da Praia / rua Machado dos Santos / rua de São João / rua do Mercado / rua do Peru, até à Calheta (área piscatória a nascente). Este eixo é o da tradicional «rua direita» da cidade.

Depois, já pelos séculos XVI-XVII, uma estrutura urbana de tipo irradiante, e com sentido perpendicular à área fusiforme antes descrita, ampliou a urbe até ao largo do Colégio, que marcava então um novo limite da expansão urbana. As ruas referidas, de poente para nascente, abriam desde a Matriz e a rua dos Mercadores, e são as seguintes sete:

- rua do Castilho, rua do Gaspar (ou Dr. Bruno Carreiro), rua Carvalho Araújo, rua Pedro Homem, rua d?Água, rua dos Manaias e rua de João Moreira.

Marginando-as no sentido oeste-este, uma espécie de pré-circular (o seiscentista «Caminho Novo») definia a extensão desse limite ao longo da cidade, desde a rua Dr. Aristides da Mota, passando o Jardim Antero de Quental e o largo do Colégio (onde está a actual Biblioteca nova), e depois seguindo pela rua de Santo André (ou Dr. Falcão, com o convento), pela rua Margarida de Chaves e ainda pela rua da Mãe de Deus, até à saída nascente para a avenida D. João III (esta de implantação recente) e para a estrada das Laranjeiras.

O crescimento de Ponta Delgada prosseguiu para norte, ao longo deste anterior limite (veja-se o mapa por Michelotti, de 1814, in Biblioteca e Arquivo Regional de Ponta Delgada). Até à área do Palácio de Santana, nos séculos XVIII e XIX, várias ruas assinalaram este crescimento, que uma nova e nítida «primeira circular» redefiniria, passando, de poente a nascente, pela avenida Antero de Quental (mais recente), rua do Papa Terra, rua de S. Joaquim, rua José do Canto, caminho ou rua de São Gonçalo, e, a partir do cruzamento com a estrada das Laranjeiras, entroncando mais recentemente na via larga da actual 2.ª circular.

A área confinada entre aquelas circulares (pré-circular e primeira circular), porém, não apresentava já a densidade de construção dos sectores mais antigos da cidade, pois incluía diversos jardins e parques privados, como os de António Borges (Parque da Cidade, municipal desde 1957), a nascente, os da actual Universidade dos Açores e da Alameda Duque de Bragança ? todos procurando uma feição romântica própria de Oitocentos, com profusa arborização e um traçado interno mais informal. A avenida Gaspar Frutuoso, sensivelmente a meio desta malha, e abrindo para norte do jardim Antero de Quental, arborizada, já foi edificada na primeira metade do século XX, com algumas moradias notáveis do modernismo.

O desenho da malha urbana viária nesta área também assumiu um carácter diferente do das anteriores, pois é de tipo muito alongado (tendência que já se pressentia, embora mais atenuada, na malha contígua a sul), com lotes muito estreitos no sentido oeste-este, mas muito alongados de sul para norte. Conjugado com esta peculiar malha, a qual evoca de algum modo a persistência de valores rurais adentro da urbe, estão várias das famosas ruas estreitas e longas, de passeios minúsculos, pavimentados a pedra branca e negra, que fizeram a má fama do suposto desconforto do trânsito pedonal na cidade (era a área conhecida como «dos forais do século XIX»).

Para norte da primeira circular assim definida, implantaram-se ainda outros parques, residências, equipamentos e serviços, como o parque e palacete de Santana, o jardim de José do Canto, algumas escolas secundárias, a Estação Agrária, o Quartel de S. Gonçalo (e os primeiros hipermercados, já nos finais de Novecentos).

Já da transição dos séculos XIX-XX, deve ser a área de vocação industrial e utilitária, à volta do eixo recto da rua de Lisboa, no sector poente da cidade ? estabelecendo um eixo que liga o central largo 2 de Março (aqui, de um modo imperfeito, em ligação com a área mais antiga da urbe), com a recente Rotunda do Monumento à Autonomia e, daí, estruturando o acesso ao aeroporto.

Dos meados do século XX é a implantação da avenida marginal (Infante Dom Henrique, 1948-1952), que, anulando polemicamente a antiga linha de costa, o cais central e a sua velha praça, com o arco da cidade (onde D. Carlos desembarcou em 1903), permitiu apesar de tudo (e com uma arquitectura retrógrada e historicista numa primeira fase, edificada na novas praças de Gonçalo Velho e de Vasco da Gama), criar uma nova frente urbana de sentido moderno, turístico e mundano, abrindo finalmente a cidade ao mar. O completamento desta marginal, já nos anos de 1980-1990, ganhou a nova Marina da cidade, por aterro dos espaços do antigo cais da Calheta.

Também na segunda metade e nos finais do século XX, completou-se a já referida segunda circular, a norte do conjunto de Santana e do Hospital do Espírito Santo, já com uma expressão de via-rápida e carácter extra-urbano (ou, infelizmente em certos aspectos, suburbano). Essa via, ligando o ampliado e renovado aeroporto João Paulo II à cidade, passa hoje sucessivamente (de poente para nascente) sobre as antigas e tradicionais saídas para os Arrifes, para as Capelas, para a Fajã de Cima, ligando-se à primeira circular no nó das Laranjeiras (e saída para a Fajã de Baixo), e evoluindo de seguida para a rotunda de Belém, e daí para a estrada da Ribeira Grande.

Ao longo do século XX, surgiram vários instrumentos de urbanização e planeamento, desde o Ante-Plano de Urbanização por João de Aguiar, em 1946, passando pelos esbocetos por Nereu Fernandes e Soares de Sousa, até ao «Plano Geral de Urbanização de Ponta Delgada e Áreas Envolventes», de 1990, por José Lamas e Carlos Duarte. José Manuel Fernandes

 

Arquitectura A arquitectura popular apresenta uma grande riqueza e diversidade de tipos e exemplos no concelho de Ponta Delgada. No estudo da Arquitectura Popular dos Açores (Ordem dos Arquitectos, 2000) o mapa tipológico reproduzido atesta bem esta profusão, pois quase todas as tipologias vernáculas da ilha, urbanas e rurais, das mais simples às mais complexas, estão representadas nesta área concelhia.

Em 1982 o inquérito realizado no âmbito daquela investigação permitiu de facto encontrar inúmeros destes tipos de habitação: a casa com cobertura de palha (na Candelária, aliás a única ainda habitada, já então degradada) (1982, Arquitectura Popular dos Açores); a casa rural com fachada de «janela-porta-janela», de espaço interno «integrado», isto é incluindo adentro das 4 paredes de pedra a sala, os quartos e a cozinha, que constitui o tipo mais corrente de habitação popular nesta área ocidental de S. Miguel (quer em meio rural quer em ambiente urbano); a casa de «empena-fachada» ou «abarracada», com planta idêntica à anterior, mas com um piso superior bem aproveitado, uma vez que as duas águas se colocam perpendicularmente à fachada (nas Sete Cidades, na Várzea); a original «casa dos Arrifes», freguesia a noroeste de Ponta Delgada, de implantação perpendicular aos longos arruamentos rectilíneos (são casas com os compartimentos em linha, tendo uma porta para a cozinha e outra para a sala).

Vários temas construtivos e espaciais correspondem a estes tipos de habitat: a «falsa» (estrado de madeira, para melhor aproveitamento do desvão sob a cobertura, em meio-piso acima da cozinha, com escada de acesso desde esta; a correspondente «janelinha da falsa», abrindo exteriormente sobre a porta da cozinha (Mosteiros, Arrifes). Finalmente, o tema comum às ilhas orientais: o de um complexo e completo sistema de «lareira-chaminé-forno», instalado na cozinha e com o volume cilíndrico saliente, do forno, para o exterior da casa. É de referir ainda, em termos urbanos, as séries de cancelas nas casas de «janela-porta-janela», separando a entrada da habitação da rua, ao longo da via principal da Fajã de Cima.

No campo não habitacional, as formas populares surgem por exemplo nos «impérios» locais, aqui designados de «teatros» ou «treatros» (designação comum a Santa Maria), com a forma corrente e modesta de pequenos alpendres, sobrelevados em relação à rua, com 3 vãos na fachada, e uma cobertura de duas águas, ao modo dos templos gregos, com frontão e 2 colunas separando as aberturas (exemplo em S. Vicente, de 1982, Arquitectura Popular dos Açores). A arquitectura auxiliar, de apoio ao armazenamento rural, traduz-se em pequenas construções de madeira (como o «granel», com exemplos nas Sete Cidades, nos Mosteiros), e a «Casa de Despejo», com paredes de pedra e cobertura de palha (nos Mosteiros, 1982, Arquitectura Popular dos Açores).

A arquitectura doméstica em Ponta Delgada apresenta inúmeros exemplos qualificados, num plano de desenho entre as formas estritamente eruditas e as de sabor mais vernáculo ? e desde os modelos mais «chãos» aos mais barroquizantes. O solar urbano dentro do chamado «Estilo Micaelense» foi definido por Luís Bernardo Leite de Ataíde: apresenta uma fachada com vãos moldurados por perda negra basáltica, e decorados por elementos relevados com formas de «rombos» e de «suásticas».

Dentro da malha urbana mais central, a casa solarenga apresenta por vezes um corpo prismático, sobrelevado, como que uma torre com janelas. Esta «casa torreada», supõe-se, seria destinada a melhor observação da chegada dos navios, constituindo um elemento construtivo «de ver o mar» (como sucede no Funchal).

O território da área envolvente a Ponta Delgada denuncia a existência de estruturas das grandes propriedades rurais, com vestígios dos antigos pomares e terrenos de cultivo, muito incrementados no século XIX (o ciclo do comércio da laranja, os ananases). Muros altos de pedra e sebes também muito elevadas ainda se encontram, como antigas divisórias dos pomares, formando por vezes uma quadrícula agrária, pontuada aqui e acolá com torres-mirantes, com passadiços sobre os caminhos (ligando os vários terrenos entre ruas), nestas terras de laranjais e ananases.

A arquitectura monumental religiosa também apresenta exemplos notáveis no concelho, sobretudo dentro da cidade: a Igreja Matriz de São Sebastião inclui alguns originais portais manuelinos, quer no negro basalto quer com pedra calcária trazida do Continente (o portal principal). A igreja de São José, com o convento franciscano (depois adaptado a hospital, de frontão neoclássico, no século XIX) exibe uma vasta fachada sobre a praça, explorando os contrastes entre o negro basalto e a superfície caiada de branco ? tal como o vizinho conjunto das clarissas, o Convento de Nossa Senhora da Esperança, dedicado ao culto do Senhor Santo Cristo, um edifício da fase barroca, com torre de vãos protegidos por reixas (como sucede na Lagoa). Santo André (o actual Museu Regional da cidade) e o singelo Recolhimento de Santa Bárbara (na rua das Manaias, infelizmente arruinado) são outros exemplos desta arquitectura dos séculos XVII-XVIII.

O antigo convento e anexa igreja da Graça foi recuperado por Luís Cunha para exposições e auditório, como «Academia das Artes», num gosto neo-vernáculo e «pós-moderno», em 1979. A Igreja do antigo Colégio Jesuíta, que constitui a fachada sacra mais impressiva e original da cidade, dentro do gosto afirmativo e monumentalizante da Ordem, foi recuperado recentemente para instalação da Biblioteca e Arquivo (por José Lamas e Carlos Duarte, nos anos 1990-2000). A igreja de São Pedro, de original planta interna poligonal (como alguns exemplos continentais e brasileiros), e a mais recente igreja da Mãe de Deus (de 1925) constituem outros dois exemplos assinaláveis neste campo ? tal como o actual Palácio da Conceição (um antigo Convento, com igreja, no largo 2 de Março), e a delicada Capela de Santana, no enfiamento das ruas centrais, no eixo sul-norte da cidade, articulada com o anexo conjunto de Santana.

A arquitectura civil inclui dois exemplos específicos: o edifício da Câmara Municipal (com o fronteiro monumento a S. Miguel Arcanjo, de 1950), exibindo um escadório duplo na fachada, como noutros tipos edílicos municipais (em Lagoa, Vila Franca, Ribeira Grande, e na Praia da Vitória); e as «Portas da Cidade», setecentistas, com 3 arcos, de 1783, recolocadas nos anos de 1950 na nova praça de Gonçalo Velho. Vestígios das antigas arcadas do cais, então demolido, podem ver-se adentro do vizinho «Café Royal».

Os solares urbanos de desenho mais erudito apresentam grossos embasamentos de pedra, salientes sobre o passeio, e fachadas que exploram o contraste do negro e do branco. Podem referir-se como os mais destacados: na praça 5 de Outubro, do lado oriental, um imóvel com lintéis rectos, de complexo e barroquizante desenho, sobre a série de vãos; o «Solar das Sereias», ou casa de Carlos Bicudo, na rua do Melo n.º 62, com portal barroco, e colunas salomónicas na fachada da capela, com inscrição de 1718; o solar oitocentista do largo de São João (antiga escola Roberto Ivens); o imóvel do Marquês de Praia Monforte, do século XIX, tendo as sacadas com pavimento de ferro (frente ao jardim Padre Sena de Freitas); o antigo e monumental Palácio da Fonte Bela (antigo liceu Antero de Quental), no largo Mártires da Pátria; e o edifício do «Club Micaelense», fundado em 1859.

Outros monumentos em núcleos dos arredores são o «Solar do Loreto» e a vizinha igreja de Nossa Senhora dos Anjos, na Fajã de Baixo (esta com fachada poligonal, de 1791), a igreja de São Roque, em Rosto de Cão, o «Conventinho de Belém», e, com especial destaque, o «Solar das Necessidades», no Livramento, portentoso solar rural setecentista, a recordar as «casas grandes» contemporâneas, do Recôncavo baiano.

 

Arquitectura dos séculos XIX e XX

O Palácio e Jardins de Santana constituem o mais emblemático conjunto do Romantismo oitocentista, pela paisagística, pelo gosto classicizante, pela decoração pictórica e azulejar. Da mesma época, existem em Ponta Delgada alguns «chalets» e avarandados e marquises de ferro.

No século XIX e inícios do XX também se erigiram alguns equipamentos de valor, como os pavilhões do Mercado Municipal (em «arquitectura do ferro»), o grandioso Coliseu Micaelense (de 1917, recentemente recuperado), o Palacete de São Pedro (actual hotel, desde 1965).

Obras mais modestas, mas mesmo assim características ou originais, da transição dos séculos XIX-XX, são a casa da antiga sinagoga da ilha (num piso superior da rua do Brum n.os 14-16), e a Loja «New York», na rua Machado dos Santos n.º 13 (com azulejos Arte Nova da «Rue do Paradis»).

O segundo quartel de Novecentos dará origem à arquitectura do Art Deco e do Modernismo na cidade. Destacou-se então a obra do engenheiro-artista Manuel António Vasconcelos, com espaços comerciais como o «Bureau de Informações-Turismo da ?Terra Nostra?» (de 1934, na praça da Matriz) e a «Barbearia Gil» (de 1942, na esquina da rua Manuel da Ponte com a rua Machado Santos) e também residências (casa própria e casa do dr. Friedmann, na avenida Gaspar Frutuoso, ambas de 1939).

No gosto das «Artes Decorativas» (Art Deco) podem mencionar-se obras mais modestas mas interessantes, como os Balneários Municipais da praça 5 de Outubro, e o jardim de Antero de Quental, com monumento por Canto da Maia (este incompleto, em 1942). O Monumento à «Grande Guerra», por Raul Lino, junto ao forte de São Brás, homenageou os mortos da I Guerra Mundial, com uma estrutura algo rígida mas forte.

O período da chamada «Arquitectura do Estado Novo» criou um conjunto monumental no centro e marginal da cidade, dentro de uma linguagem neo-tradicional e historicista, com a nova Praça de Gonçalo Velho (pelo arquitecto Quintanilha, cerca de 1950-1952), com a colunata do edifício da Alfândega (por Lucínio Cruz, inaugurado em 1965, na praça Vasco da Gama), e ainda com o Palácio da Justiça, inaugurado em 1968. O vasto Cine-Teatro Micaelense (de 1947-1951, por Rodrigues Lima) foi nos anos 2002-2005 recuperado e modernizado por Manuel Salgado.

A afirmação da designada «Arquitectura Moderna» foi no concelho obra sobretudo do arquitecto micaelense João *Rebelo (1923-2006), o qual edificou espaços comerciais, habitações e equipamentos numa perspectiva esteticamente arejada e tecnicamente inovadora ? e tomou uma atitude frontal contra a arquitectura passadista da marginal da cidade, num corajoso manifesto de sua autoria que ficou célebre («Senhor Ministro... Esta Arquitectura É / Esta Arquitectura Não É»).

Podemos destacar, dentre as suas obras: o Colégio de São Francisco Xavier, da Congregação de São José de Cluny (com Alzina de Meneses, de 1955-1958, inaugurado em 1959), o Seminário Diocesano do Senhor Santo Cristo (de 1958-1966, hoje adaptado a hotel), a grandiosa Central Térmica do Caminho da Levada (de 1959-1961), a Clínica do Bom Jesus, inaugurada em 1966, e o dinâmico prédio do «Centro Médico Rosa» (1957-1961), imprimindo modernidade em plena avenida marginal de Ponta Delgada ? além da singela casa Pacheco de Chaves, na rua Nova n.º 53, de 1958.

Nos anos de 1970-1980, há obras informadas pelo «pós-modernismo», como a nova Escola das Laranjeiras, por Farelo Pinto, e o edifício do «Canto da Fontinha», na esquina da rua da Vitória, por João Maia Macedo.

Jorge Kol Carvalho, fixado na ilha, projectou vários equipamentos e infra-estruturas ao longo de 20 anos, em 1984-2003: a Marina, Piscinas e Clube Naval, no cais da cidade (1988); as Oficinas de Varela e Ca. (1993); o Quartel do Bombeiros Voluntários (1994); e, nos arredores, o Pavilhão Desportivo da Escola dos Arrifes (1998).

Já nos anos mais recentes, o crescimento da Universidade dos Açores permitiu a edificação de inúmeras obras pedagógicas inovadoras, sendo de destacar o conjunto dos Anfiteatros da Universidade, por Inês Lobo (1998-2003) ou a Biblioteca Central da Universidade (por Paula Santos / Atelier de Santos, de 1997-2203).

Qualificador do espaço rural concelhio, o Prémio SECIL 2002 de Arquitectura foi atribuído à «Casa Pacheco de Melo», por Pedro Maurício Borges, em S. Vicente Ferreira, valorizando uma obra de notável plasticidade e modernidade.

Numa perspectiva de actualidade, há ainda que mencionar o percurso de Bernardo Rodrigues, com obras inovadoras como por exemplo a da moradia para a irmã, o «Domus Impluvium», nas Capelas (2006). José Manuel Fernandes

 

Aspectos Económicos O concelho de Ponta Delgada está situado no extremo poente da ilha de S. Miguel, sendo um dos cinco concelhos desta ilha. No censo de 2001, apresentava uma população presente de 65.746 indivíduos e uma população residente de 65.854. Com 233 km2 de área a densidade populacional é de 276,9 hab/km2, um valor muito superior aos 106 hab/km2 dos Açores (INE, 2002).

A população activa reparte-se pelas diversas áreas de actividade, incluindo a agrícola e agro-pecuária, a industrial e a dos serviços. Na área industrial destacam-se a produção de alimentos compostos para animais, lacticínios, açúcar, bolachas, produtos de tabaco, produtos de carne, metalúrgica, etc. A indústria da construção civil ocupa também um lugar significativo nas actividades do concelho. Os serviços abrangem as actividades do sector público, do comércio, do turismo e restauração, dos serviços imobiliários e dos serviços financeiros.

Servido por um aeroporto e por um porto internacional, o concelho de Ponta Delgada é a principal porta de entrada e saída de pessoas e de mercadorias dos Açores. É, para além disso, sede do Governo e o principal centro de prestação de serviços da Região.

Na costa sul da ilha de S. Miguel, numa zona invulgarmente plana, a cidade de Ponta Delgada proporcionou excelentes condições para o desenvolvimento de um verdadeiro centro de serviços. No passado, esteve estreitamente ligada à exportação da laranja, assumindo, mais tarde, a função de apoio à navegação do Atlântico Norte.

Actualmente, o concelho de Ponta Delgada apresenta uma amostra das principais actividades económicas que se desenvolvem nos Açores. Com uma forte concentração na área dos serviços, o concelho não deixa de ter, mesmo assim, um papel importante na produção industrial e na produção primária, particularmente a que está associada à agro-pecuária. A bacia dos Arrifes e Covoada é uma das zonas mais importantes da ilha de S. Miguel e dos Açores no que toca à produção de leite. Igualmente importantes na produção primária são todas as freguesias localizadas para poente.

Em 2002, das 5.388 camas dos Açores, em unidades de alojamento, Ponta Delgada concentrava uma oferta de 2.422 lugares (45% do total e 76% da oferta de S. Miguel).

Segundo o Recenseamento Geral Agrícola de 1999 (INE, 1999), havia, em Ponta Delgada, nesta data, 2.891 explorações agrícolas. A quase totalidade destas explorações (2.833) tinha a natureza de produtor singular por conta própria. A quase totalidade da mão-de-obra utilizada é familiar, com os homens a representar um pouco mais do que as mulheres (4.430 e 3.657, respectivamente). O efectivo animal, em 1999, incluía 46.928 bovinos, dos quais 22.478 eram vacas leiteiras (23% do total dos Açores).

Em 1999, das 5.170 empresas com sede em Ponta Delgada, 639 (12%) eram do sector primário, 1.412 (27%) eram do sector do comércio, 966 (19%) de construção civil, 326 (6%) da indústria transformadora, 304 (6%) dos transportes, armazenagem e comunicações, 518 (10%) de actividades imobiliárias, alugueres e outros serviços prestados às empresas e 349 (7%) do ramo de alojamento e restauração.

A taxa de actividade do concelho era, em 2001, de 44,4%, valor superior aos 42% da Região Autónoma dos Açores.

O volume de vendas das sociedades sediadas atingiu, em 2003, 2.289,2 milhões de euros (INE, 2006). Em 2002, o orçamento da Câmara Municipal atingiu os 42,6 milhões de euros (SREA, 2004: 121).

Em 2003, 20% da população era pensionista (SREA, 2004: 138).

Ponta Delgada apresentava, em 2002, um Índice Per Capita de Poder de Compra de 93,2% da média nacional, um valor significativamente superior ao dos Açores que, nesta mesma data, atingiu os 73,3%.

A economia de Ponta Delgada pode caracterizar-se pela sua diversificação e elevada expressão nos sectores dos serviços, em geral, e do turismo, em particular. Mário Fortuna

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