Governo dos Açores - Secretaria Regional da Educação, Ciência e Cultura - Direção Regional da Cultura

Lajes das Flores, concelho de

Heráldica Por portaria de 21 de Maio de 1960, publicada no Diário do Governo a 30 do mesmo mês, foram aprovadas as armas, bandeira e selo do concelho das Lajes das Flores. Os motivos do escudo das armas estão relacionados com a actividade económica mais importante e, por isso, sobre o vermelho, uma vaca preta malhada de negro, coleirada e chocalhada de ouro, sobre terreno verde, ladeada por duas hortênsias, folhadas de verde. Em chefe, um açor realçado de ouro, segurando nas garras uma quina de Portugal; em contra-chefe, um mar ondeado de três faixas de prata e verde. A bandeira é esquartelada de branco e azul, tendo ao centro o escudo das armas encimado por uma coroa mural de prata de quatro torres e listel branco com a legenda: Lajes das Flores. A haste e a lança são douradas; os cordões e as borlas, de prata e azul. O selo é circular, tendo ao centro as peças das armas e referência à Câmara Municipal de Lajes das Flores. Carlos Enes

Urbanismo

A Vila e as freguesias do concelho

O concelho das Lajes detém uma característica única em todo o arquipélago: trata-se do município situado mais a ocidente da Europa. Quanto à sua designação, Lajes constitui um topónimo corrente nos Açores (sucede no Pico e na Terceira), provavelmente referente a massas pétreas ou superfícies de rocha lisa nas suas imediações.

Historicamente, é ainda controversa a origem e datação da vila das Lajes, apontando-se a data de 1515 como a da fundação da vila:

«Silveira Macedo, por exemplo, escreve que só em 1515 é que consta fora criada a vila das Lagens com a sua matriz e mais algumas freguesias, sendo-o a vila de Santa Cruz vários anos depois [...] ao comentar, porém, estas afirmações [...] observa um dos anotadores dos ?Anais? que nenhum documento e nenhum autor do século XVI confirmam quer a primazia quer a data. Parece absolutamente inadmissível haver já uma vila nas Flores em 1515» (Gomes, 1984: 72-73). De facto, o povoamento definitivo da ilha teria começado poucos anos antes. Mas é um facto que as Lajes foi mais populosa e importante que Santa Cruz, durante alguns séculos: «Em 1587, por exemplo, o cosmógrafo Luís Teixeira, naquela que é a mais antiga relação demográfica da ilha, atribui à primeira [Lajes] 300 habitantes e apenas 150 à segunda [Santa Cruz]. No início de Setecentos, Cordeiro dá as Lajes como tendo mais de 300 fogos e Monte Alverne 320 fogos (1200 pessoas). A Santa Cruz, concedem estes respectivamente mais de 200 fogos e 180 fogos (900 pessoas)» (Gomes, 1984: 73).

Há ainda alguns dados sobre os seus monumentos iniciais: «Diogo das Chagas, aqui, sempre adianta que a padroeira é Nossa Senhora do Rosário, e que existiam, na época, três ermidas na vila: a de Santa Ana, no lugar da Fazenda (é a única referência conhecida a esta ermida), a de Santo António, sobre a rocha do porto, e a do Espírito Santo, numa Calheta à saída do porto, ?onde abicam barcos? [...]» (Gomes, 1984: 39).

A formação de sucessivas paróquias na área do actual concelho correspondeu ao lento mas contínuo desenvolvimento do povoamento, desde Quinhentos: em 1676 criou-se a freguesia de Nossa Senhora do Rosário, com a Ponta da Fajã, a Fajã Grande, a Fajãzinha, a Caldeira e o Mosteiro, sendo a sede na Fajãzinha. Possivelmente em 1698 foi constituída a freguesia da Lomba, de invocação de S. Caetano; e, já no século XIX, surgiu a do Lajedo, em 1823.

Na segunda metade de Oitocentos assiste-se à fundação das mais recentes paróquias do concelho das Lajes, com a de Mosteiro e da Caldeira (em 1850) e a de Fajã Grande, em 1861.

 

A estrutura urbana das Lajes

Muito vulnerável a assaltos dos corsários e piratas, a vila das Lajes foi objecto de vários ataques nos primeiros séculos. Sendo lugar portuário, mais vulnerável ainda seria, aspecto que talvez justifique os recuos que a implantação dos principais edifícios e monumentos apresentam em relação à linha de costa. Efectivamente, a igreja matriz dista substancialmente do cais, e a Câmara mais ainda.

A orientação geográfica da vila apresenta-se sensivelmente no sentido de oes-noroeste e de es-sudeste. A sua estrutura é de tipo grosseiramente linear, desenvolvendo-se a sucessiva implantação das casas e equipamentos, a partir do Monte e dos Morros, sobre uma espécie de longa e estreita lomba (entre a Ribeira Seca e a Ribeira das Lajes) até ao pequeno promontório no extremo oriental da costa, onde assenta o cais.

O largo da Câmara Municipal e o largo da Igreja Matriz constituem os dois pólos principais da vida urbana, mas a distribuição das construções segue uma implantação em geral dispersa e de forma orgânica, adaptada ao relevo irregular ? sem portanto dar azo a que a malha urbana das Lajes constitua uma rede geométrica, ou sequer claramente densa e ordenada.

As ocupações mais recentes, ao longo do século XX ? a área do Rádio Farol, e, mais recentemente, a do porto novo, alargaram esta disposição espacial, sem porém a contrariarem.

 

As paróquias

As fundações sucessivas dos povoados que servem as outras freguesias do concelho assumiram características próprias, na forma e na implantação no território. A mais original e bela é sem dúvida a da Fajãzinha, espraiada num amplo vale, aberto a poente e recebendo as várias cascatas dos penhascos envolventes (e com um largo central, o Rossio, com igreja e «império», agradavelmente arborizado); já a Fajã Grande tem aspecto mais urbano e concentrado, ao longo de uma rua principal; a Ponta da Fajã constitui apenas uma singela «linha» de casario, bordejando o mar e o penhasco; enquanto das outras, apenas aldeias, se pode mencionar o Mosteiro, a Lomba, o Lajedo, e a Cuada (abandonada e recentemente recuperada como «aldeia de turismo rural»). José Manuel Fernandes

Arquitectura

A Vila

Defrontando o mar, a Igreja do Rosário foi erigida no século XVIII e restaurada no XIX. Apresenta no seu interior ricas talhas e imagens sacras. O seu espaço envolvente articula-se com uma ponte oitocentista e um singelo mas panorâmico jardim. Muito perto, uma antiga casa solarenga (com os tradicionais aventais em bico nos vãos da fachada) emprestava, nos anos 1980, um sentido arcaico a todo o sítio.

Mais abaixo da igreja, as casas antigas do caminho do cais antigo, térreas (entretanto infelizmente desaparecidas com o rasgamento do novo porto), eram aquando do Inquérito à Arquitectura Popular (1983-1984), das mais significativas construções do seu tipo em todo o arquipélago. Conhece-se o desenho e o aspecto de duas delas: frente ao cemitério, a chamada «Casa do Capitão», uma construção datada, no lintel de pedra da entrada (1723), e com uma cornija recebendo o beiral, pormenores raríssimos em construções simples e vernáculas como esta (ficha n.o 49 do Arquivo Arquitectura Popular dos Açores [AAPA]); e a casa designada no local como da «Maria Capona» (ficha n.o 50 do AAPA), de expressão idêntica à anterior. Ambas apresentavam uma planta de tipo linear, com duas portas e uma janela para a frente, e dois compartimentos internos: a sala-quarto e a cozinha. Em ambas as casas também se encontrava uma «copeira», isto é, um nicho escavado na parede interna, servindo de armário, ornado com um lintel de moldura clássica.

Os edifícios modernos, do século XX, são poucos mas significativos: o conjunto de habitações do Rádio Farol, dos anos de 1940-1950 (foi estação rádio naval até 1993), de gosto neo-tradicional (dentro do gosto oficial do Estado Novo, o chamado «Português Suave») e a Pousada, de desenho claramente moderno, dos anos 1950-1960. O edifício da Câmara Municipal, apesar de tardio na sua edificação (está datado de 1960), é também representativo da arquitectura do Estado Novo dos meados da centúria novecentista.

O novo porto, edificado nos anos 1980-1990, constituiu uma verdadeira transformação da vida da vila, pela dinâmica local que introduziu e pelas alterações profundas da área costeira onde se implantou.

Na relação funcional com este porto, podem referir-se alguns projectos por Jorge Kol Carvalho para o local: o Farol e o Marégrafo, de 1993, e o edifício Polivalente, de 2000.

Mencione-se ainda, nas Lajes, a Capela de Nossa Senhora das Angústias, erigida por náufragos no século XVIII.

 

As freguesias

Como se refere na abordagem ao tema urbano, a povoação da Fajãzinha é a mais interessante do ponto de vista paisagístico e de implantação. Esta característica é complementada na arquitectura, pelo conjunto dos edifícios do seu largo central: a igreja de Nossa Senhora dos Remédios, de 1776-1783, de interessante fachada em «negro e branco», e o império fronteiro. Mencione-se ainda ter existido na área um fortim, também da invocação de Nossa Senhora dos Remédios, em 1710 (que depois desapareceu), bem como, arruinados, alguns moinhos com roda vertical (raridade também no conjunto das ilhas, cf. ficha n.o 27 do AAPA).

Algumas casas vernáculas da povoação mereceram um destaque, no quadro do levantamento da arquitectura popular efectuado em 1983-1984: a chamada «Casa do Padre», logo acima da igreja (ficha n.o 19 do AAPA), de forma equilibrada e planta em «L», com dois pisos. Mais original é a chamada «casa das camaretas», muito arruinada (cf. ficha n.o 26 do AAPA), com uma estrutura interior de tabique com duas passagens e dois estrados para as camas dos seus ocupantes, ao modo do que se utilizava no Norte do continente, na Póvoa do Varzim.

Na Fajã Grande há que destacar o conjunto das casas da rua principal, pela sua feição urbana, coesão e uniformidade, e, em conjunto com algumas construções remanescentes na Ponta da Fajã, a existência de óculos de iluminação nas fachadas de dois pisos, com originais formas: em rombo ou losango (Fajã Grande) e em estrela de quatro pontas (Ponta da Fajã, cf. ficha. n.o 36 do AAPA).

É de mencionar que as primeiras armações baleeiras dos Açores se implantaram na área da Fajã Grande, que cresceu e se tornou durante algum tempo a segunda povoação da ilha (em meados do século XIX), provindo talvez desta fase o carácter mais urbano das casas de dois pisos na sua rua principal (cf. fichas n.os 32 e 34 do AAPA); hoje existe uma vigia da baleia, memória destes tempos, na zona acima do povoado.

No Mosteiro havia também, em 1983-1984, algumas casas de dois pisos com arco térreo de volta redonda, em pedra, de acesso à loja dos animais ? outra característica original do concelho (cf. n.os 56 e 57 do AAPA).

Termine-se esta resenha breve com a referência à Lomba, com a igreja de S. Caetano, de 1753-1759, restaurada em 1888. José Manuel Fernandes

História Fica situado na parte sul da ilha das Flores, diocese de Angra, com sete freguesias, *Fajã Grande, *Fajãzinha, *Fazenda, *Lajedo, *Lajes das Flores, *Lomba e *Mosteiro, tendo uma população de 1.502 habitantes, 545 famílias e 893 edifícios (Censos de 2001). Fez parte do antigo distrito da Horta, antes da Autonomia Politico-Administrativa de 1976, tendo passado para a sua jurisdição em 1822, com o júbilo que o poeta florentino, padre José António Camões, deixa transparecer no seu poema de 14 de Abril de 1822. Anteriormente dependia directamente de Angra do Heroísmo (Gomes, 2003: 47, 105, 106).

Não há unanimidade sobre se foi pelo sul ou se pelo norte que entraram os primeiros povoadores da ilha. Uns historiadores referem ter Antão Vaz, proveniente da ilha Terceira, entrado pelo sul, pelas Fajãs de Lopo Vaz, situada próximo da vila das *Lajes, mas outros indicam que terá sido pelo norte, nomeadamente pela Ribeira da Cruz, onde Guilherme da Silveira, proveniente da ilha do Faial, terá entrado para a procura de metais, como já o fizera nessa ilha.

O investigador de história regional Francisco António Gomes, que compilou, documentou e escreveu as opiniões de diversos historiadores, essencialmente em Frei Diogo das *Chagas, no padre Gaspar *Frutuoso, no padre Inácio *Cordeiro, Frei Agostinho *Monte Alverne e em António Lourenço da Silveira *Macedo, sustenta a tese de uma ocupação dispersa da ilha designadamente pelas Fajãs ali existentes (Gomes, 2003). Refere que nos primeiros anos do século XVI já existiria a paróquia de Nossa Senhora do Rosário, havendo mesmo quem assevere que as Lajes já era vila em 1515. Esclarece ainda que, para além de ter sido a primeira vila instituída nas Flores, foi a povoação mais importante e populosa da ilha durante cerca de dois séculos, passando então essa primazia para a vila de Santa Cruz (Gomes, 2003: 105).

Os limites do concelho situam-se entre as nascentes da Ribeira das Casas e da Ribeira da Silva, com passagem pela Fonte dos Frades, excepto o lugar da povoação da Ponta da Fajã que se situa abaixo da rocha, segundo a versão dos antigos, nomeadamente do padre José António Camões, conjugada com as matrizes prediais da ilha (Leite, 1990: 476-506). Esses limites, contudo, nunca foram juridicamente homologados por falta de entendimento entre as câmaras municipais da ilha que, no século XIX entraram em franca contradição sobre a divisão dos baldios (Gomes, 2003: 671-675). A povoação da Ponta terá pertencido inicialmente à freguesia de Ponta Delgada, então integrada no concelho de Santa Cruz das Flores. Por outro lado, a povoação da *Caveira pertenceu durante alguns anos à paróquia da Lomba, embora juridicamente dependesse de Santa Cruz, como descreve o padre Camões nas suas Memórias das Flores de 1822, tendo ambas a mesma origem militar.

Entre 18 de Novembro de 1895 e 13 de Janeiro de 1898, o concelho esteve anexado ao de Santa Cruz das Flores, tendo sido desanexado depois de insistentes pressões quando era presidente do Conselho de Ministros do Reino, José Luciano de Castro (Gomes, 2003: 675-676). Salienta-se que aquela anexação teve lugar na sequência de reclamação feita pelas autoridades municipais de Santa Cruz, a que se juntaram «abaixo-assinados» feitos por alguns habitantes da freguesia da Fajã Grande, quando presidia ao Governo de Lisboa o micaelense Ernesto Hintze Ribeiro.

Nos seus baldios, administrados pelos Serviços Florestais desde 1964, existem sete lagoas: Funda, Rasa, Negra (também conhecida por Funda da Fajãzinha), Comprida, Branca, Seca e Lomba.

Não se sabe ao certo quando foi instituída a primeira Câmara Municipal, mas sabe-se que em 1888, quando se edificou a ponte da Ribeira Seca, próxima da actual igreja, ainda existia nas suas proximidades, na margem esquerda, o primeiro edifício da Edilidade, que então servia de cadeia. Assim, a Câmara funcionou em edifício de renda até que, entre 1961 e 1966, foi edificado o actual edifício, inaugurado em 20 de Agosto de 1967, onde ficaram instalados todos os serviços públicos do concelho, designadamente, Secretaria Municipal, Finanças, Tesouraria, Registo Civil e Notariado, Fundo de Desemprego e Assistência. Em 10 de Abril de 1995 foi inaugurado um polivalente anexo, para onde passaram alguns desses serviços, bem como a Delegação da Caixa Geral de Depósitos (Gomes, 2003: 106).

Os seus habitantes vivem essencialmente da agro-pecuária, dos serviços e da pesca. Predomina a pequena exploração tipo familiar para a produção de gado bovino de carne e de leite, para lacticínios, intensificada em resultado da emigração para os Estados Unidos da América e Canadá, sobretudo a partir de 1954 e da globalização da economia. Com esta intensificação essa produção praticamente substitui a antiga produção de milho, batatas (branca e doce), feijão, inhames, couves e outras hortaliças, hoje em decadência acentuada; nos serviços os maiores empregadores são os serviços públicos do Município, da Região (Serviços Agrícolas e Pecuários) e do Estado (Finanças, Registos Civil, Predial e Comercial e do Notariado); a pesca também é menos significativa do que há anos atrás. No século XIX foi importante no concelho a produção do linho e seus derivados, bem como da lã, cujos ovinos se mantiveram nos baldios até ao início da década de 1960, nomeadamente até estes passarem para a administração dos Serviços Florestais.

O Farol de Lajes das Flores, situado na vila, na ponta SE da ilha, na latitude 35º 10? N e na longitude 31º 10? O GW, cuja construção foi iniciada em meados da década de 1890, entrou em actividade em 1910 e é um excelente auxílio à muita navegação que por ali transita (Trigueiro, 2004: 6). Melhorado ao longo do século XX, recentemente foi objecto de obras de modernização, ficando então a constituir uma das unidades mais modernas da especialidade. Nele funcionou, desde 1938, a Estação da Rádio Naval das Flores até à inauguração das suas instalações em 25 de Agosto de 1951 (Trigueiro, 2003: 83-87). A criação dessa Estação, que se situava nas proximidades e existiu por razões semelhantes às do Farol, acabou por ser desactivada no início da década de 1990, considerada desnecessária face às novas tecnologias de navegação. O mesmo aconteceu com a Estação Loran, inaugurada no início da década de 1960 e desactivada pelos mesmos motivos nos últimos anos da década de 1970, a qual se situava na freguesia da Fazenda.

É neste concelho que se situa o porto das Flores, onde em 9 de Janeiro em 1992 acostou o primeiro navio, passando a ser utilizado pela navegação de longo curso, embora a sua inauguração oficial só se tenha feito depois do porto concluído em 12 de Junho de 1994 (Trigueiro, 2003: 235-244). Dotado com um pequeno molhe de abrigo, onde recebe também elevada quantidade de iates, o seu cais acostável comporta sectores para cargas, passageiros e pescas.

Nas suas proximidades existe a antiga fábrica de óleo de cachalotes onde se encontra um museu em embrião, dotado com um bote e de outros equipamentos da faina, actividade essa ali exercida até à década de 1970. O porto das Lajes é um dos portos das Flores onde a caça ao cachalote, iniciada no século XIX, mais se desenvolveu, havendo mesmo momentos em que ali chegaram a exercer a sua actividade diversas armações, com destaque para a firma Maurício António de Fraga & C.ª Ld.ª (Trigueiro, 2003: 133-146). Esta empresa, que acumulava essa indústria com outras actividades económicas de grande relevo para a economia do concelho, nomeadamente nos transportes marítimos locais e na produção e comercialização de lacticínios, bem como no comércio geral a retalho e por grosso, chegou a ser das maiores empregadoras da ilha.

No concelho das Lajes situam-se diversos pontos de interesse turístico, agora servidos por várias estradas interiores, destacando-se a Rocha dos Bordões, a vista da Pedrinha, as lagoas Funda e Rasa vistas pelo norte e pelo sul, a vista dos Frades, as lagoas da Lomba e da Fajãzinnha (Negra ou Funda, Comprida, Seca e Branca), o Miradouro do Presidente Craveiro Lopes, a Rocha do Toiro, na Lomba e a vista da Caldeira, na Fazenda. Propícios para o turismo a pé, ainda se podem encontrar no concelho outras vistas de grande beleza paisagística. Na descida às freguesias da Fajãzinha e da Fajã Grande, berços dos poetas Alfredo Luís e Pedro da Silveira, respectivamente, pode ver-se de um lado as altas rochas das Fajãs, verdejantes e serpenteadas com quedas de águas, e do outro a imensidão azul do Atlântico, onde se vê a curta distância o ilhéu do Monchique, a parte terrestre mais ocidental da Europa. José Arlindo Trigueiro

Aspectos Económicos O concelho de Lajes das Flores é um dos dois desta ilha. No censo de 2001, apresentava uma população residente de 1.502. Com 70 km2 de área a densidade populacional é de 21 hab/km2, a mais baixa dos Açores (INE, 2002).

No concelho está localizado o porto que serve a ilha. O aeroporto está localizado no concelho vizinho.

A população activa reparte-se por diversas áreas de actividade, incluindo, com destaque, a agrícola e agro-pecuária e a dos serviços.

A indústria da construção civil ocupa um lugar pouco significativo nas actividades do concelho. Os serviços concentram-se, essencialmente, nas actividades do comércio.

O turismo não tem qualquer expressão e a restauração tem uma expressão muito pouco significativa na economia do concelho.

Segundo o Recenseamento Geral Agrícola de 1999 (INE, 1999), havia, nas Lajes das Flores, nesta data, 305 explorações agrícolas. A quase totalidade destas explorações (303) tinha a natureza de produtor singular por conta própria, sendo apenas duas sociedades. A quase totalidade da mão-de-obra utilizada é familiar, com os homens a representar 57% do total (364 e 272, respectivamente). O efectivo animal, em 1999, incluía 2.943 bovinos, dos quais 396 eram vacas leiteiras (13% do total do concelho).

Em 1999, das 147 empresas com sede nas Lajes das Flores, 66 (45%) eram do sector primário, 31 (21%) eram do sector do comércio, 8 (5%) de construção civil, 8 (5%) da indústria transformadora, 8 (5%) dos transportes, armazenagem e comunicações e 13 (9%) do ramo de alojamento e restauração, dispersando-se as restantes por outros ramos.

A taxa de actividade do concelho era, em 2001, de 40,2%, valor inferior aos 42% da Região Autónoma dos Açores.

O volume de vendas das sociedades sediadas atingiu, em 2000, 3,1 milhões de euros (INE, 2001). No mesmo ano, o orçamento da Câmara Municipal atingiu os 2,3 milhões de euros (SREA, 2001: 128).

Em 1999, 10% da população era pensionista (SREA, 2001: 150).

As Lajes das Flores apresentavam, em 1997/99, um Índice Per Capita de Poder de Compra de 42,58% da média nacional, um valor significativamente inferior ao dos Açores que, nesta mesma data, atingiu os 66,5%.

A economia deste concelho pode caracterizar-se pela sua concentração na base agro-pecuária. Mário Fortuna

Aspectos religiosos A 24 de Junho de 1481, o Papa Xisto IV, na bula Aeterni regis clementia, confirmava a submissão da ilha das Flores à Ordem de Cristo. Na perspectiva do acompanhamento espiritual, esta ilha obedecia ao modelo utilizado para as demais parcelas açorianas, sendo o prior desta Ordem o responsável pelo acompanhamento dos insulares até à sujeição do arquipélago açoriano à diocese do Funchal, em 1514. Contudo, se considerarmos que a efectiva dinâmica do povoamento desta ilha teve lugar a partir de 1503, é natural que a maior responsabilidade pelo pasto religioso dos lajenses tenha recaído sobre a Sé de Angra, fundada em 1534.

Na vertente temporal, a ilha das Flores constituía uma comenda, sendo responsabilidade do comendador (e, portanto, não do governador da Ordem de Cristo) a construção das igrejas, a manutenção das respectivas fábricas grossas e o pagamento das côngruas eclesiásticas. No século XVII, o cronista Frei Diogo das Chagas manifestava a inoperância deste modelo sui generis no seio do arquipélago, na medida em que o comendador não dispensava os dízimos para colmatar as necessidades espirituais, o que impedia a fundação de novos templos e a angariação da imprescindível mediação sacerdotal, e, acrescentava este frade florentino, levava a que as «almas corressem perigo».

A fundação das igrejas e ermidas deverá ter seguido o modelo habitual nos Açores. Ameaçada pelas intempéries da natureza insular e particularmente isolada pelo distanciamento geográfico das suas congéneres, a população da ilha procurou o apaziguamento espiritual na devoção cristã, levando o referido cronista a caracterizar a sua gente como sendo «mui caritativa, espiritual, e devota». Segundo as informações dos séculos XVI e XVII, o primeiro templo desta ilha, invocado ao Espírito Santo, terá sido edificado junto ao porto das Lajes, naturalmente como espaço de apoio e de defesa contra eventuais ataques de corsários. Aliás, terão sido precisamente as investidas dos ingleses em 1587 que causaram a destruição desta ermida e que suscitaram a sua reedificação posterior numa zona mais interior da vila. As outras duas ermidas existentes no período do povoamento, Santa Ana e Santo António, também destruídas pelos ataques dos finais do século XVI, terão sido prontamente reconstruídas em palha, tendo os seus ornamentos e imagens sido salvaguardadas pelos sacerdotes locais durante os desembarques dos corsários. Já no século XVIII, entre 1763 e 1783, a coroa seria responsável pela edificação da igreja matriz da vila das Lajes, invocada a Nossa Senhora do Rosário, precisamente construída no local onde se reconstruíra a já referida ermida do Espírito Santo. O edifício da matriz sofreu múltiplas reparações, mas mantém-se de pé até aos nossos dias. Séculos depois, num outro contexto demográfico e social, seria o investimento dos emigrantes um elemento importante para garantir a vivificação religiosa, como sucede em 1847, quando António de Freitas funda a igreja da Santíssima Trindade, nos Mosteiros, depois de ter permanecido alguns anos em Macau.

A fragosidade da ilha e o povoamento disperso dos primeiros tempos do povoamento obrigavam os florentinos a um esforço adicional para o acompanhamento do quotidiano religioso. É o caso de João Soares, morador nos Mosteiros, que todos os domingos se deslocava de batel juntamente com a sua família para a vila das Lajes para ouvir missa. Por isso, no século XVII, Frei Diogo das Chagas faz questão de referir a necessidade de diversas povoações serem elevadas à dignidade de freguesias, de forma a providenciar de forma mais eficaz o acompanhamento dos florentinos. Seria o crescimento demográfico da ilha o propulsor do progresso paroquial, gerando as sete freguesias que actualmente compõem o concelho das Lajes: Fajã Grande (S. José), Fajãzinha (Nossa Senhora dos Remédios), Mosteiros (Santíssima Trindade), Lajedo (Nossa Senhora dos Milagres), Lomba (S. Caetano), Fazenda (Senhor Santo Cristo) e Lajes das Flores (Nossa Senhora do Rosário).

A crescente malha paroquial conduziu ao concomitante desenvolvimento da burocracia eclesiástica. A criação da primeira ouvidoria na ilha das Flores, com sede na vila das Lajes e com jurisdição sobre a ilha do Corvo, deverá ter ocorrido nos finais do século XVI. A sua existência não foi constante, tendo partilhado ou, por vezes, cedido a tutela religiosa à ouvidoria da vila de Santa Cruz. Pelo decreto de 21 de Julho de 1993, as Flores voltaram a constituir uma única ouvidoria, atendendo-se ao actual reduzido número de sacerdotes e à facilidade de comunicações entre as várias freguesias.

Tal como sucede nas restantes ilhas do arquipélago, as famílias florentinas contribuíram para a constituição de um clero secular autóctone. No período entre 1698 e 1861, para o qual há registos diocesanos, encontramos 95 candidatos às ordens sacras naturais desta ilha. Contudo, a partir de inícios de Oitocentos, há uma crescente escassez de interessados na carreira eclesiástica: consideremos que há 63 pretendentes que se inscrevem na Mitra da Diocese de Angra entre 1698 e 1798, valor que se reduz para 32 entre 1803 e 1861. Aliás, em consequência desta paulatina desertificação das hostes sacerdotais, o decréscimo no número de clérigos na ilha das Flores é visível logo nos primeiros anos do Liberalismo. Se, em 1808, o pasto sacerdotal florentino era partilhado por 17 sacerdotes, em 1833 esse número reduz-se para 12. Na transição da Monarquia para a República, os registos de entradas no seminário açoriano efectuados entre 1872 e 1924, reflectem uma tendência semelhante: dos 24 jovens florentinos que estudam em Angra, apenas 8 adquirem o título de presbíteros.

No decurso de mais de 400 anos de povoamento, a ilha das Flores foi fiscalizada pelos superiores episcopais com pouca frequência, tendência menos visível no decurso da primeira metade de Setecentos, quando as visitações ocorreram num ritmo quase quinquenal. As primeiras visitações ocorreram logo após a fundação da Sé de Angra, durante o episcopado de D. Agostinho Ribeiro, que exerceu funções de sacerdote nesta ilha. Todavia, considerando o período de 1550 a 1996, as Flores foram apenas visitada 37 vezes, no que resulta uma média de uma visita pastoral em cada 12 anos, num claro incumprimento das advertências da suprema hierarquia católica, que advogava visitações anuais ou bienais. Se a suprema autoridade diocesana se mostrava desleixada na manutenção de elos com os florentinos, a situação é semelhante ou até mais grave em relação às instituições reinóis ligadas à vigilância religiosa. O braço inquisitorial estendeu-se até esta ilha, embora o número dos infractores lajenses tenha sido escasso: resta saber se por inoperância da Inquisição se pelo comportamento idóneo dos mesmos. Assim, apenas verificamos dois casos de indivíduos envolvidos nas malhas da Inquisição de Lisboa, curiosamente ambos elementos da Igreja: o frei António Fialho, acusado em 1799 de proferir proposições contra a moral; e o padre António José Álvares, alegado maçon que, em 1802, é acusado de comer carne em dias proibidos, afirmar que o casamento não é um sacramento, advogar a não necessidade de se jejuar na Quaresma nem de se cumprir com o sacramento da Penitência.

No que concerne às manifestações de carácter confraternal, destaca-se, como parte integrante do modelo do associativismo açoriano, a relevância das irmandades dedicadas ao Divino Espírito Santo. A predominância deste culto no século XIX e o concomitante ambiente liberal terão suscitado a desagregação de outras confrarias que sabemos terem existido, como a de Santa Bárbara, que agregava os fregueses da matriz da vila das Flores. Aliás, a visita Ad Limina realizada pelo bispo D. Francisco José Ribeiro de Vieira, em 1898, não indica quaisquer outras irmandades na ilha. A intensa devoção dos florentinos ao Espírito Santo manifesta-se pela realização das «vôdas», festas e bailes. Simultaneamente, o escasso circuito geográfico e a reduzida dimensão da rede social desta ilha potenciam a relevância que as actividades relacionadas com esta manifestação religiosa suscitam, chegando a originar certos conflitos, como o que sucede no império da Fajãzinha, em 1875, a propósito da eleição dos respectivos mesários. Actualmente, o concelho das Lajes tem 14 impérios, cuja expressão devocional está sedeada, na sua maioria, em construções da segunda metade do século XIX. Susana Goulart Costa

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