[século XV] Primeiro capitão-do-donatário das ilhas de Santa Maria e de S. Miguel. Era filho de Fernão Velho, alcaide-mor do castelo de Valada, da Ordem de Cristo, e de D. Maria Álvares Cabral. Foi comendador do castelo de Almourol, de Beselga, das Pias e da Cardiga e pertenceu à casa do Infante D. Henrique. Em 1426, realizou uma viagem à Terra Alta e, em 1431-1432, terá comandado duas viagens de exploração às ilhas dos Açores, muito provavelmente com o objectivo de avaliar a possibilidade de as terras recém-descobertas (em 1427) receberem povoadores e aí lançando, para tal, alguns animais domésticos. Com o início do povoamento das ilhas, entre 1439 e 1443, instalou-se em Santa Maria, tendo sido o primeiro capitão desta ilha e da de S. Miguel, que, até 1474, estiveram unidas numa só capitania: «meu cavaleiro e capitão, por mim, em minhas ilhas de Santa Maria e de Sam Miguel», assim aparece designado em documento registado por Gaspar Frutuoso (1983: 114). Deste modo, foi Gonçalo Velho quem dirigiu in loco a instalação dos primeiros colonos nas ilhas dos Açores, garantindo o cumprimento das ordens do Infante. Regressou ao reino em data desconhecida, sucedendo-lhe na capitania um sobrinho, João Soares de Sousa ou João Soares de Albergaria, e ficando a jurisdição desta ilha na posse dos descendentes deste último até à extinção da linhagem, com Brás Soares de Sousa, em 1664. Apagada durante séculos, a memória de Gonçalo Velho seria recuperada no final do século XIX e, sobretudo, no início da década de 1930, por ocasião do centenário (1932) que então se supunha corresponder à data da descoberta dos Açores. Em 1894, no contexto das comemorações henriquinas, Ernesto do Canto imprimiu a Homenagem do Arquivo dos Açores ao Infante D. Henrique, na qual valorizou essencialmente a figura de Gonçalo Velho, que, enquanto descobridor das ilhas açorianas, devia ser considerado como um precursor de Colombo. Décadas mais tarde, em 1932, coincidindo com a estratégia de afirmação do Estado Novo e a sua utilização da história como instrumento de legitimação, tiveram lugar, em clima de polémica historiográfica, as comemorações do descobrimento dos Açores, sancionadas pelo parecer científico da Sub-Secção de História da Sociedade de Geografia de Lisboa, que, neste ponto, seguiu a tradição frutuosiana. O centenário, traduzindo embora os legítimos sentimentos regionalistas, não estava dissociado da política de propaganda do regime salazarista e da defesa do Império e da obra civilizadora dos portugueses. Neste quadro, compreende-se a importância que adquiriu a figura do Infante D. Henrique nas comemorações de 1932. Todavia, as cerimónias oficiais, iniciadas a 15 de Agosto, em Vila do Porto, se insistiram na ciência do Infante, concederam o protagonismo a Gonçalo Velho, herói açoriano, porque descobridor e povoador das ilhas, apresentado simultaneamente como homem do Infante e um seu prolongamento, aquele que teria sido o obreiro do pensamento de D. Henrique. José Damião Rodrigues (Abr.2002)
Bibl. Canto, E. (1983), ?Centenário do Infante D. Henrique. 1394 ? 4 de Março ? 1894?. Arquivo dos Açores, XII: 449-455. Diário dos Açores (1932), A comemoração do V Centenario do Descobrimento dos Açores. 12.047, 16 de Agosto: 8. Arquivo dos Açores (1981), Donatarios de Santa Maria 1432-1645. Ponta Delgada, IV: 193-206. Frutuoso, G. (1983), Livro Terceiro das Saudades da Terra. Ponta Delgada, Instituto Cultural de Ponta Delgada. Peres, D. (1983), História dos Descobrimentos Portugueses. 3ª ed., Porto, Vertente. Riley, C. G. e Rodrigues, J. D. (1994), O Infante, os Açores e a memória local no contexto das Comemorações Henriquinas In O Infante e as Ilhas, Conferências da Sessão Comemorativa do VI Centenário do Nascimento do Infante D. Henrique. Atlântica, Funchal, 4: 51-74. Rodrigues, J. D. (1995), Sociedade e Administração nos Açores (Séculos XV-XVIII): O caso de Santa Maria. Arquipélago (História, 2), I, 2: 33-63. Sá, A. (1899-1900), Frei Gonçalo Velho. Lisboa, Imprensa Nacional.