Governo dos Açores - Secretaria Regional da Educação, Ciência e Cultura - Direção Regional da Cultura

teatro

Se nos tempos mais recuados o teatro teve vivência nos Açores por influência das ordens religiosas e notícias de representações teatrais de carácter popular em várias ilhas. Mas a expressão laica e moderna do teatro se verificou nos primórdios do século XIX, por influência de continentais. Assim aconteceu na Horta, cujo primeiro teatro, denominado Teatro de Tália, funcionou de 1814 a 1822. Pouco depois, por iniciativa de um militar, surgiu em 1826 o Teatro Constitucional Boa União, que deixou de funcionar entre 1828-1832. A presença das forças liberais que permaneceram nos Açores a partir do golpe de 22 de Junho de 1828, quando na Terceira se restaurou a Carta Constitucional, até à partida do exército libertador, em 1832, foi fundamental para alargar o gosto pelo teatro.

Nesta primeira fase, as representações teatrais eram apenas apanágio de uma elite citadina. Funcionavam em pequenas salas improvisadas, apresentando peças de autores nacionais, nomeadamente Garrett, até surgirem os primeiros textos de escritores locais. Em São Miguel é conhecida a existência do teatro de São Sebastião, que funcionou de 1824 a 1859; o Teatro Instrução e Recreio (1842) ou a Sociedade Teatral Juvenil (1845); ainda em São Miguel notícias de teatro nas Furnas em 1853 e na Ribeira Grande; em Santa Maria foi reactivado, em 1855, o Teatro União e Recreio, havendo uns anos mais tarde, outros dois: Teatro Club e Sociedade Musical União e Recreio. Para Angra, no início dos anos 30, havia o teatro «22 de Junho», para homenagear a data histórica referida do movimento liberal, a que se seguiram outros espalhados pela cidade: um a funcionar no Castelo de São João Baptista, em 1885, para oficiais, e três pequenos teatros particulares a funcionar no final do século XIX ? um no Granel do Alto das Covas, pertença de João Maria Afonso, outro de João Maria Gonçalves Branco, na Rua das Frigideiras, e outro na Sociedade Filarmónica na Rua dos Cavalos. Na residência do Conde da Praia havia uma pequena sala com a designação de Príncipe Real, e ainda outra na Rua do Marquês, conhecida como sala Marquês de Pombal. No caso da Horta, para além dos artistas de fora do arquipélago, é conhecida a actividade de um grupo de amadores que construiu um pequeno teatro no convento de Santo António, em 1845; a Sociedade de Artistas que realizou espectáculos entre 1850 e 1875, e também récitas no Grémio Literário ou na Sociedade Humanitária de Literatura e Agricultura. Nas outras ilhas, a dinâmica teatral foi mais reduzida, mas mesmo assim bastante antiga. Para a Graciosa, conhece-se a existência de um pequeno teatro «Influência da Mocidade», em 1838; em São Jorge, no princípio do século XIX fazia-se teatro nas vilas, em armazéns cedidos para o efeito, e em 1864 fundaram-se duas sociedades com esse fim e que representaram dramas em voga. O primeiro teatro da Vila do Topo data de 1882 e o Clube Estímulo, na Calheta, foi inaugurado em 1902. Em Santa Cruz das Flores a Sociedade de Regeneração Florentina foi inaugurada, com dramas e comédias, em 1874, embora tivesse havido representações anteriores; pouco depois surgiu o Teatro Luz e Caridade (1881) e a Sociedade Recreio Útil (1883).

O grande salto para a expansão do teatro concretizou-se com a construção das três salas de espectáculos nas capitais de distrito: em Angra, foi erigido o Teatro Angrense, em 1842, na Travessa da Saúde, sendo erigido um segundo com o mesmo nome, em 1860; o velho Teatro União Faialense teve as suas portas abertas de 1856 a 1915, havendo um segundo em 1916; o Teatro Micaelense começou a funcionar em 1865, mas não sobreviveu a um incêndio em 1930. Voltou a ser reconstruído em 1951, tendo o Coliseu Avenida servido, no entretanto, para esse fim. Estas três salas foram grandes pólos dinamizadores da actividade teatral, e de muitos outros acontecimentos culturais, não com grupos das próprias ilhas, mas também recebendo artistas do continente e do estrangeiro.

Uma dimensão aproximada desse fenómeno cultural ficou bem patente no registo de Augusto *Gomes num livro sobre o Teatro Angrense e nos vários artigos de Francisco Maria *Supico, sobre São Miguel, nas suas Escavações. O teatro popular micaelense também mereceu estudos aprofundados por Maria Medeiros Franco e José da Almeida Pavão, analisando a estrutura e características das chamadas Comédias, que nesta ilha são verdadeiros melodramas.

Duma forma geral, até à II Guerra Mundial o teatro nos Açores era uma diversão predominantemente citadina, em espaços públicos, em associações culturais ou em casas particulares. Os anos 20 trouxeram grandes mudanças comportamentais e a abertura de sociedades recreativas de cariz mais popular, no período da I República, contribuiu para que o teatro atingisse outros públicos. A expansão da Acção Católica, nos anos 30, para os meios rurais foi outro factor decisivo para que o teatro se implantasse nessas localidades. Para o efeito contribuiu a acção do clero, mas também o papel do professor primário.

Deste modo, os antigos teatros continuaram a cumprir a sua função, mas outras salas ou esplanadas foram abrindo gradualmente, dando guarida a grupos de teatro. Para a Terceira, registe-se o grupo da Sociedade Recreio dos Artistas, o da Sociedade União Operária Musical Angrense e o Grupo Dramático do Sport Club Lusitânia. Na Praia da Vitória foi inaugurado, em 1922, o Salão Teatro Praiense. Na Horta, o fenómeno foi idêntico: entre 1924-1962 funcionou o grupo do Fayal Sport Club, entre 1925-1934 o do Sporting Club da Horta. Em São Miguel o teatro da Ribeira Grande abriu as suas portas em 1933, encerrando em 1986, para ser adquirido pela Câmara Municipal.

Na sequência do trabalho desenvolvido pela Acção Católica, o período que se seguiu à II Guerra Mundial foi prolífero em grupos de teatro nas freguesias rurais e que eram conhecidos por «Comédias». Na Terceira, por exemplo, quase todas as freguesias criaram o seu grupo ou grupos que representavam aos fins-de-semana nas mais diversas localidades. O espectáculo compunha-se de um drama, uma comédia e um acto de variedades. Toda esta actividade foi facilitada pela construção de sociedades de cultura e recreio, mas o prolongamento da guerra colonial contribuiu para o declínio dos espectáculos. Paralelamente, o gosto pelo teatro também entrou pelas portas dos liceus que encerravam as actividades do ano lectivo com representações. O movimento teve alguma expressão a partir dos anos 50, mas com interrupções.

A década de 60 corresponde a outra mudança significativa, com a introdução do teatro de vanguarda. Angra sofreu essa influência por intermédio de um professor do continente ali colocado no liceu, José Louro. Com esta linha de orientação, o trabalho prosseguiu com o advogado José Orlando *Bretão, regressado de Coimbra. Dentro desta dinâmica foi criado o Círculo de Iniciação Teatral, na Fanfarra Operária, e o conhecido Grupo Alpendre será o seu continuador. Na Horta, o processo foi iniciado por António Duarte, com a fundação do grupo TE-HOR, que durou até 1984, ano da morte do seu fundador. Aos poucos, o teatro de vanguarda ganhou novos espaços e novos adeptos. Não surgiram escritores locais como também encenadores. Registe-se por exemplo, na área da encenação João Mendonça, José Medeiros e Elisa Gomes (em São Miguel); Álamo Oliveira, Eduarda Reis, Eduarda Borba, Moisés Mendes e Valter Peres (na Terceira); Nelson Monforte (no Pico); Sérgio Luís, Tiago Porteiro e Victor Rui Dores (na Horta).

Em 1998, estavam registados na região 56 grupos de teatro activos em sete ilhas: São Miguel, 27; Terceira, 17; Faial, 3; Pico, 5; Santa Maria, São Jorge e Graciosa, um cada. Mas, em Março de 2007 estavam registados apenas 32 grupos de teatro amadores; destes, apenas 25 mantinham actividade regular e estavam devidamente constituídos em cooperativas ou em associações culturais sem fins lucrativos, estando, assim, distribuídos pelas seguintes ilhas:

Santa Maria

«Camacho CATS», Vila do Porto.

«Grupo de Teatro ?Karolas?, Clube Ana», Vila do Porto.

 

S. Miguel

«Máquina do Tempo», Ponta Delgada.

«A Pontilha», Ribeira Grande.

«Amphitheatrum», Ribeira Grande.

«Artepalco», Ribeira Grande.

«Brincando e Rindo», Candelária.

«O Ponto», Capelas.

 

Terceira

«Alpendre», Angra do Heroísmo.

«A Teia», Praia da Vitória.

«Pedra-», Altares.

«Grupo de Teatro da Terra Chã», Terra Chã.

«Teatrinho», São Bartolomeu.

«Grupo de Teatro ? Recreio ? Criações Eduarda Reis», Feteira.

 

Graciosa

Grupo de Teatro «Semente», Praia.

 

S. Jorge

«O Palco», Rosais.

«O Arco», Ribeira do Nabo.

«A Tradição», Beiras.

 

Faial

«Carrocel», Horta.

«Teatro de Giz», Horta.

«Sortes à Ventura», Escola Secundária Manuel de Arriaga, Horta.

«Bicas», Flamengos.

 

Pico

«Muitieramá», Lajes do Pico.

«Colmeia», Criação Velha.

 

Flores

«A Jangada», Santa Cruz.

 

O teatro moderno não aniquilou as *Danças do Entrudo, uma variante do teatro popular. (ver Danças do Entrudo). Carlos Enes e Victor Rui Dores

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