Governo dos Açores - Secretaria Regional da Educação, Ciência e Cultura - Direção Regional da Cultura

Sousa, Manuel Inácio de

[N. Horta, 20.12.1739 ? m. Pilar, Conceição, Horta, 11.5.1801 (cf. Rosário, 2005: 135)] Licenciado em Cânones, comerciante e poeta. Era filho de Domingos de Sousa e Silva, natural da ilha Graciosa, e de sua mulher Bárbara da Trindade, natural do Faial, aquele escrivão da Câmara e esta constando ser taberneira, com exercício na Rua da Boa Viagem (Rosário, 2005). Estudou em Instituta (Universidade de Coimbra) onde obteve o grau de bacharel em Cânones (1764), com a classificação de Nemine discrepante, completando a sua formatura em 1766, atingindo o grau de licenciado também com a mesma informação de Nemine discrepante (Rodrigues, in press; Topa, 2001). Concluído o curso, possivelmente depois de dois a três anos em Lisboa (Silveira, 1977: 50), regressou à Horta.

Em 1770, viria a solicitar e a obter a tutoria de sua sobrinha Luísa Francisca Sarmento de Lacerda (cf. Biblioteca Pública e Arquivo Regional da Horta, Registo de baptismos, Liv. 6, fl. 158, Matriz da Horta; Rosário, 2005: 134), Luísa Francisca de Sousa Sarmento (cf. Topa, 2001: 21), órfã de seu irmão António de Sousa e Silva e de sua mulher Clara Angélica Sarmento (cf. Biblioteca Pública e Arquivo Regional da Horta, Registo de baptismos, Liv. 6, fl. 158, Matriz da Horta), com quem viria a casar e de quem haveria de ter sete filhos entre os quais Francisca Cordélia de *Sousa (Faria, 2005; Topa, 2001: 21).

Atento à coisa pública, fez advocacia, foi almotacé (1779) (Biblioteca Pública Arquivo Regional da Horta, Câmara Municipal da Horta, Vereações, Liv. 13, fl. 31), oficial da Câmara Municipal (1782) (Biblioteca Pública Arquivo Regional da Horta, Câmara Municipal da Horta, Vereações, Liv. 13, fl. 74) e provedor dos bens dos defuntos e ausentes (1791). Elaborou uma memória sobre portos que, entre outros documentos, se encontra no Arquivo Histórico Ultramarino, em Lisboa (Açores, maço 19) (Silveira, 1977: 50).

Associado a seu irmão, reverendo João José de Sousa, estabeleceu uma casa comercial destinada à importação de linho e de fazendas que vendia por atacado, e à exportação de vinhos do Pico e de outros produtos para o Brasil e para países do norte da Europa, que chegou a dispor de pelo menos sete navios matriculados na Horta, tornando-se, segundo Macedo (1871), Rodrigues (in press) e Silveira (1977), um armador e um homem de negócios.

Com a morte do irmão em 24 de Outubro de 1784 (Rosário, 2005: 134), tornado herdeiro de toda a fortuna, deixou o negócio e dedicou-se à construção do palacete do Pilar, sobranceiro à cidade da Horta, onde viria a residir durante mais de uma década. O palacete viria a distinguir-se pelos requintes de luxo e de bom gosto que o ornavam e pelas festas sumptuosas que nele tiveram lugar, assinaladas por expressões de arte ? músicas, cantos e recitativos, e que reuniram o que havia de superior em inteligência e em talento na Horta de então. Pedro da Silveira refere os nomes de Francisco Vieira Goulart, João Pereira de La Cerda, Fr. Tomás da Soledade, Vitalino Brum da Silveira, todos poetas, e D. Ana Cândida de Arriaga, senhora dada aos prazeres da literatura (Silveira, 1977: 50, 76). Entre os seus amigos de Coimbra e de Lisboa, Silveira (1977: 50) enumera o açoriano João Cabral de Melo, Alvarenga Peixoto, Tomás Gonzaga, Domingos M. Torres e Reis Quita, que o refere no idílio «A Amizade».

No jardim envolvente sobressaíam estátuas, vasos da Índia, arbustos e um lago decorado com conchas e búzios raros. O chafariz e o repuxo em frente da casa, eram também obras de arte que embelezavam o local (Graça, 1868; Lima, 1943: 552; Macedo, 1871, 1: 271; 1959; Telégrafo (O), 1910; Topa, 2001).

Considerado por Pedro da Silveira «talvez o melhor dos neoclássicos açorianos» (Silveira, 1977: 7), a sua obra poética está actualmente fixada num total de 23 textos apresentando uma grande variedade de formas poemáticas e de recursos técnicos (Topa, 2000; 2004). Mas o que mais importa notar é que estamos perante um poeta, e um poeta de certo interesse no panorama do neoclassicismo português (Topa, 2004). Publicou apenas uma tradução do inglês (1788), uma égloga (1789) e uma elegia (1790), mas deixou obra poética, inédita, que foi publicada por Macedo (1881), Rebelo (1881), Silveira (1977; 1984) e Topa (2001).

Na ode «Enquanto pelos campos estendidos», verso 67, Manuel Inácio de Sousa refere-se ao Pilar como: «Aos verdes montes do Pilar subindo, / Estendo por te ver os olhos tristes; / Mas não te avisto, e se vou descobrindo / O sítio venturoso aonde existes, / Chamo por ti e tu a meus gemidos / Voltas a face, cerras os ouvidos!» (cf. Topa, 2001: 75).

«Aos anos da Excelentíssima Senhora D. Ana Arriaga» dedicou o poema em quadras heptassilábicas «O tempo tudo arrebata» e o soneto «Risonha nasce a aurora neste dia» (cf. Topa, 2001: 71).

Em 19 de Março de 1986, a Câmara Municipal da Horta deliberou atribuir o seu nome a uma rua na parte alta da cidade (Câmara Municipal da Horta, Livro de Actas, 120, fl. 134). Luís M. Arruda

Obra (publicada em vida): (1788), Relação da conversação do reverendíssimo senhor João Thayer, há pouco ministro protestante em Boston, na América do norte, escripta por elle mesmo, a que vão anexos varios extractos, etc.. Lisboa, Officina de Francisco Luiz Ameno [segundo Inocêncio Francisco da Silva, Diccionario Bibliographico, é «traducção do inglez, e sahiu sem o nome do traductor; segundo Topa (2001: 23) não parece oferecer garantias de pertencer a M. I. de Sousa]. (1789), Que fresco sítio e sombra dileitosa, Collecção de obras poeticas dos melhores authores. Porto, Officina de Antonio Alvarez Ribeiro, I: 222-224 [égloga, anónima, atribuída a M. I. de Sousa por Topa (2001: 29)]. (1790), Perdoa, sombra ilustre, se o sossego. Lisboa, Jornal Encyclopedico dedicado á Rainha Nossa Senhora, e destinado para instrução geral com a noticia dos novos descobrimentos em todas as sciencias, e artes. Lisboa, Officina de Antonio Gomes: 199-202, Fevereiro [elegia, dedicada à morte do Sr. D. José, Príncipe da Beira e do Brasil, em 11 de Setembro de 1788, exposta, no dia de suas exéquias, na ilha do Faial].

 

Fontes: Biblioteca Pública e Arquivo Regional da Horta, Registo de baptismos, Liv. 6, Matriz da Horta. Id., Câmara Municipal da Horta, Vereações, Liv. 13. Câmara Municipal da Horta, Livro de Actas, 120.

 

Bibl. Faria, F. (2005), Um poeta no palacete do Pilar, Correio da Horta, Horta, n.º 21433, 20 de Dezembro. Graça, J. J. (1868), A casa do Pilar, O Atlântico, Horta, 26 de Março [transcrito em Boletim Municipal, Câmara Municipal da Horta, 1989, ano 7, n.º 50, Fevereiro]. Lima, M. (1920), Amizade, Caridade. In Walter Bensaúde. Angra, Tipografia do Povo: 9-15. Macedo, A. L. S. (1871), História das quatro ilhas que formam o districto da Horta. Horta, Typ. de L. P. da Silva Correa, 1. Rebelo, E. (1881), Em quanto pelos campos estendidos. Grémio Litterario, Horta, Ano II, n.º 33, 1 de Novembro: 70-71. Rodrigues, J. D. (in press), As elites locais nos Açores em finais do Antigo Regime. Arquipélago (História). Rosário, F. G. (2005), Memória genealógica das famílias faialenses. [Angra do Heroísmo], Instituto Açoriano de Cultura. Silveira, P. (1977), Antologia de Poesia Açoriana do século XVIII a 1975. Lisboa, Sá da Costa. Telégrafo (O) (1910), Horta, n.º 4821, 12 de Março, Experimentemos [referência às reuniões de intelectuais na casa do Pilar]. Topa, F. (2000), Novas revelações sobre o poeta setecentista Manuel Inácio de Sousa Faialense. Revista da Faculdade de Letras «Línguas e Literaturas», Porto, 17: 431-439. Id. (2001), Poesia dispersa e inédita do setecentista Manuel Inácio de Sousa. Porto, Edição do Autor. Id. (2004), O poeta faialense Manuel Inácio de Sousa ? no 2º centenário da sua morte. Boletim do Núcleo Cultural da Horta, 13: 83-87.