Governo dos Açores - Secretaria Regional da Educação, Ciência e Cultura - Direção Regional da Cultura

Aires, Fernando

(F. A. de Medeiros Sousa) [N. Ponta Delgada, 18.2.1928] Licenciado em Ciências Histórico-Filosóficas pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Foi professor efectivo no Liceu Antero de Quental, tendo leccionado a cadeira de Psicopedagogia na Escola do Magistério Primário de Ponta Delgada. Desempenhou as funções de assistente-convidado da Universidade dos Açores entre 1975 e 1994.

Pertenceu ao grupo que, nos anos 40, fundou o Círculo Literário Antero de Quental, destinado a introduzir o modernismo nos Açores. De 78 a 89 fez parte da Direcção do Instituto Cultural de Ponta Delgada. Está representado na Enciclopédia Verbo das Literaturas de Língua Portuguesa, onde também colabora desde 1993.

A sua obra (à data desta escrita) é constituída por quatro volumes do diário Era Uma Vez o Tempo e por dois de ficção, Histórias do Entardecer e Memórias da Cidade Cercada. Creio que este título da sua novela está perfeitamente interligado com o seu diário, até este momento a componente fulcral da sua escrita: o homem moderno «cercado» precisamente por uma modernidade que ele entende e aceita, mas moldada pela memória profundamente vincada de um outro tempo em que as coisas e os homens ainda não tinham perdido os seus referenciais históricos e éticos. Não quer isto dizer que o autor não conteste a vida estática que lhe havia sido legada por séculos de inércia ideológica e isolamento geográfico atlântico. Para Fernando Aires, esse tempo recordado era um misto de doces memórias da infância, mas igualmente de espera, que não de luta necessariamente activa pelo equilíbrio e justiça social que desde sempre ele absorveu da historicidade político-cultural do Velho Continente, o que ele chama a (sua) Europa-mãe. Também para F. Aires, açoriano viajado e culto, a ilha é o mundo em miniatura, o Homem moderno confinado mas não transformado, sem poder escapar à condição comum dos vastos espaços para além do horizonte de mar e céu. Estamos todos, nas suas páginas, duplamente «cercados» pela geografia e, uma vez mais, pela história; os velhos senadores de Kavafy, por assim dizer, irremediável e (pior ainda) indiferentemente sitiados pelos «bárbaros» que para F. Aires são (na realidade ou nos símbolos do nosso quotidiano) o que a pós-modernidade nos impôs, desde o relativismo estético e moral à política sem ideologia, reduzida de todo à personificação e imagem destes e de outros actores em cena. Para o autor de Era Uma Vez o Tempo, a estética das coisas e dos gestos transforma-se no próprio signo da moralidade da vida. De resto, é a presença do quotidiano que está sempre viva na sua escrita, cada gesto e palavra, cada pedaço de paisagem circundante utilizados para definir e redefinir o estado de alma de cada um em seu redor. Conhecedor e consciente da tradição literária em que se insere nos Açores desde há cinco séculos a esta parte, será talvez o mais perfeito continuador em prosa poética do simbolismo das Almas Cativas de Roberto de Mesquita, traçando assim uma inquestionável linha de continuidade na literatura moderna do nosso arquipélago. Vamberto Freitas (Dez.1997)

 

 

Adenda
[(…) – m. Ponta Delgada, 09/11/2010]. Ranu Costa (2022)