Governo dos Açores - Secretaria Regional da Educação, Ciência e Cultura - Direção Regional da Cultura

Academia Militar da Ilha Terceira

(1810-1828). Em 1797 foram reorganizados os efectivos militares nos Açores e criado na cidade de Angra ? sede da capitania-geral ? um Batalhão de Infantaria com exercício de Artilharia que ficou instalado no Castelo de S. João Baptista. Dois anos depois, por carta de 16 de Setembro, foi estabelecida uma aula de matemática no mesmo quartel, cuja abertura teve lugar em Agosto de 1805, por só então ter sido preenchido o quadro de oficiais. O plano de estudos havia sido inspirado no que era adoptado nos regimentos de artilharia do Continente. Mas os resultados dos alunos não justificaram o empreendimento. Talvez por isso a Aula de Matemática foi transformada em Academia Militar por carta régia de 19 de Novembro de 1810. Era a época da criação das escolas superiores militares: em 4 do mês seguinte era fundada a Academia Real Militar do Rio de Janeiro, com um curso de sete anos e, em 1817, o vice-rei conde do Pardo estabelecia em Goa uma Academia Militar, com sede em Pangim.

Ocupando parte do antigo Colégio dos Jesuítas da cidade de Angra - onde se instalara o Terreiro Público - que, para o efeito, recebera obras de beneficiação, a Academia Militar só iniciou as suas actividades em 4 de Novembro de 1811, com uma sessão solene presidida pelo governador e capitão-geral dos Açores e director da Academia, Aires Pinto de Sousa.

Segundo prescreviam os seus estatutos, o curso compreendia quatro anos, sendo os dois primeiros consagrados à matemática e os restantes a matérias militares: fortificação (3.º ano); balística e artilharia (4.º ano). Em dias indicados e quando o serviço militar o permitisse, os alunos deveriam frequentar as aulas de desenho, geografia e francês. De referir o destaque dado ao estudo das matemáticas que, segundo determinação estatutária, deveria considerar-se «como um dos meios necessários para que os militares possam possuir fundamentalmente, e em toda a extensão possível, os diferentes ramos de conhecimentos, que constituem a ciência da guerra» (Art.º 3 dos Estatutos, in Costa, 1847).

Frequentada obrigatoriamente pelos oficiais do Batalhão de Artilharia, esta escola facultava ainda o ingresso a alunos civis. Os seus diplomados obteriam assim as condições necessárias à sua promoção ou, no segundo caso, seriam preferidos nos concursos para cargos públicos. Programas de matérias, bibliografia, número de docentes, avaliação são algumas das rubricas tratadas no regulamento desta Academia, aliás inspirado na Carta dos Estatutos da Academia Real da Marinha, de 15 de Agosto de 1779.

A obrigatoriedade da matrícula - nem sempre cumprida - imposta aos oficiais dos dois batalhões da primeira linha existentes na ilha Terceira, bem como ao de S. Miguel e à companhia do Faial, determinaram um considerável número de inscrições nos anos de 1811-12 a 1820-21, cuja média foi de 31,1, registando o maior número no ano de abertura que foi de 54 e o menor, de 17, em 1816-17.

Todavia os reflexos da revolução liberal e, particularmente, as alterações ocorridas em Abril de 1821 motivaram uma abrupta diminuição de alunos. E a redução de efectivos militares nos Açores, a partir de 1822, provocará uma situação crítica à Academia, já que o número de «paisanos» nela matriculados foi sempre diminuto. Também não fora garantida a prioridade destes nos concursos aos cargos públicos. Aliás, alguns dos poucos civis que a frequentaram tê-lo-iam feito mais com a intenção de cumprirem o serviço militar, fruindo algum proveito, do que apenas com o propósito de obterem a habilitação na mira de um emprego no Estado. O estudo do aproveitamento escolar obtido anualmente pelos alunos desta escola permite constatar de imediato os seus maus resultados finais. De 1811-12 a 1824-25 esse aproveitamento nunca foi superior a 47 % (em 1813), situando-se, em regra, entre os 20 % e os 25 % (1814, 1815, 1817, 1819 e 1820).

Raros foram também os diplomados por esta Academia. Fazendo fé na citada estatística, em 14 anos de actividade e tendo registado um movimento apreciável de alunos, apenas 8 completaram o 4.º ano, sendo um deles civil. É certo que alguns foram transferidos para escolas similares no Continente; todavia, tal número não teria sido representativo nem de qualquer modo justificará a escassa percentagem de finalistas. Também não parece que a exigência dificultasse demasiadamente o curso. O certo é que a promoção continuava a processar-se sem a obtenção do diploma da Academia e, embora alguns militares se apresentassem no acto de matrícula, poucos frequentavam as aulas. Também os civis não se mostraram interessados por este modelo de escola. Aliás, os depoimentos dos professores são esclarecedores sobre esta matéria: a Academia era uma escola militar e, apenas como tal, não interessava à sociedade civil.

Repare-se que, já em 1825, o barão da Vila da Praia, Francisco Borja Garção Stokler, em ofício enviado a Joaquim José Monteiro Torres, não escondia o fracasso que representara a criação desta escola, pois que, em seu entender, as aulas militares só interessavam aos soldados, não tendo por isso cabimento nos Açores uma escola militar à semelhança da de Lisboa.

A situação por que passava esta Academia Militar em 1825 exigia, pois, profundas reformas. Já em data anterior dois dos seus lentes haviam sugerido a inclusão de cadeiras de navegação, dada a grande percentagem de açorianos que se dedicavam à vida marítima. Nesta data, porém, o barão da Vila da Praia apresenta um Plano de reforma de instrução pública para os Açores, reduzindo a Academia à sua dimensão normal e integrando-a no esquema tradicional proposto. As razões então aduzidas - de que a «mocidade nobre» dos Açores poderia, sem grande incómodo, ir ao Continente instruir-se na «arte da guerra» e de que no arquipélago eram necessários sobretudo conhecimentos de agricultura, mineralogia, cirurgia, farmácia e medicina - constituíram o suporte justificativo da sua proposta.

Mas a crise política e financeira então existente não viabilizava qualquer reforma de monta. A Academia Militar manter-se-ia em actividade por mais três anos, sendo definitivamente encerrada em 1832. Artur Teodoro de Matos (2007)

Bibl. Costa, F. J. (1847), Memoria sobre a antiga Academia Militar da Ilha Terceira. Angra do Heroísmo. Matos, A. T. (1980), A Academia Militar da Ilha Terceira (1810-1825), Algumas notas para o seu estudo. Boletim do Arquivo Histórico Militar, 50. Menezes, M. S. (1990), A Academia Militar da Ilha Terceira. Algumas notas. Boletim do Instituto Histórico da Ilha Terceira, XLVIII.

 

[Agradeço ao Senhor Tenente-Coronel Manuel Faria as correcções que se dignou apontar à primeira versão deste artigo em assunto de que é especialista.]