Governo dos Açores - Secretaria Regional da Educação, Ciência e Cultura - Direção Regional da Cultura

forte de São Sebastião

Foi edificado numa pequena colina que forma o extremo ESE da baía de Angra. Dada a eminência com que deste lugar se domina o Porto de Pipas, que parece ter sido o mais importante cais e estaleiro da Ilha, e ainda a facilidade com que dali militarmente se fecha a baía, surgiu cedo no pensamento dos homens da cidade, a ideia de fortificar tal porto. Sabe-se que já em 1537 D. João III encarregou Pedro Anes do Canto da construção de um baluarte, que é possível tenha sido levantado neste local. Todavia, pela carta do Cardeal D. Henrique à Câmara de Angra, de 14 de Maio de 1561, verifica-se que se tal fortificação chegou a construir-se, já não existia naquela data. Por alvará de 22 de Abril de 1562, nomeou-se mestre das obras de fortificação, com ordenado de 80$000, a Luís Gonçalves, embora as obras para a construção do castelo de São Sebastião tenham começado na melhor das hipóteses dez anos mais tarde. Com efeito, em 4 de Julho de 1572, D. Sebastião, atendendo ao que a Câmara de Angra lhe expusera, determinava a construção de dois fortes, um no Porto de Pipas e outro nos Fanais, em detrimento do que havia sido proposto construir na ponta do Monte Brasil, por «pessoas que tinham muita notícia e experiência das obras de fortificação». O Rei enviava juntamente ao corregedor Diogo Álvares Cardoso as plantas para a construção e pedia a maior brevidade na execução. Em 1576 já se achava a fortaleza, senão concluída, pelo menos muito adiantada e susceptível de ser utilizada, pois data de 25 de Outubro deste ano o Alvará de alcaidaria-mor dele passado a Manuel Corte Real. Com pequenas alterações conserva a fortaleza a traça primitiva, nos moldes do sistema de fortificações do penúltimo quartel do século XVI. Está a porta principal voltada ao Norte e flanqueada por dois corpos avançados que se destacam da cortina que ela rasga a meio. Dá-lhe ingresso uma pequena ponte sobre dois arcos de cantaria. O portal de arco pleno, também de cantaria simples, é encimado pelas armas nacionais do tempo de D. Sebastião, tendo no escudo nacional as setas alusivas ao santo padroeiro. Por baixo foi colocada posteriormente uma lápide onde se lê: Jubent epotentissimoReg ealtissimo Domino Nostro Petro II populi Patre, qui Patriam possuit suam in pace semper tutam quo regni petra erecta firmissima etangularis: castrum a Sebastiano conditum reedificatur, Anno Domini MDCXCVIII. As muralhas correm para poente e nascente e, fazendo ângulo para o sul, vêm encontrar-se nesta orientação já sobre a rocha. Do lado poente, voltado à cidade, a cortina é simples e com parapeito para armas portáteis. Pouco antes do extremo sul faz um torreão ou cubelo alto, quadrado, com janelões para a cidade, destinado ao pau de bandeira. Do lado nascente a muralha é recortada de canhoneiras e frestas que se prolongam até à plataforma de junção com a muralha do poente. Nos ângulos poente e nascente estão construídas sobre a muralha guaritas de pedra para vigias. Passada a porta principal, entra-se no corpo da guarda, constituído por uma sala, à direita. Contíguo a esta, incrustado na própria muralha e sob o adarve, protege-se o paiol. À esquerda, adossados à muralha, ficam, num pavimento alto, o alojamento do ajudante, e, por baixo, a caserna. Em frente a estes alojamentos, já no terrapleno, ergue-se a casa do Governador. Uma pequena cisterna, adossada sensivelmente a meio da muralha a Oeste e já demolida, abasteceu de água a guarnição. Todo o restante espaço interior forma uma pequena praça, onde se construiu um edifício no início do século XX, destinado posto de desinfecção, entretanto demolido. Presentemente estão a ser construídas diversas infraestruturas nesta praça, destinadas à instalação de uma pousada. Da praça desce-se por uma rampa a uma casamata soterrada com várias frestas para o mar, semelhantes às da Torre de Belém, donde se poderia fazer tiro rasante. Também da praça se passa por um pequeno calejão a uma bateria baixa, construída no extremo sul, sobre a rocha do mar e que foi reconstruída em 1830, tendo-lhe sido nessa data colocada uma lápide em basalto negro onde se encontra esculpida em belas letras capitais a seguinte legenda: BATERIA DA HEROICIDADE 11 DE AGOSTO DE 1830 NA DEFENSÃO DAS LIBERDADES PATRIAS HEROES SE EXTREMAM NO GERAL DOS POVOS. Este castelo foi a primeira grande construção marítima a ser construída na Terceira. Quando em 1583 foi ocupado pelas tropas castelhanas do Marquês de Santa Cruz estava bem artilhado. Em 1641 foi conquistado pela companhia da Ribeirinha, comandada pelo capitão Manoel Jaques, tendo sido favorecido pelo artilheiro português Caldeirão, que estava ao serviço de Espanha mas não hesitou, com risco da própria vida, lançar uma escada aos seus conterrâneos. Depois de breve luta com a guarnição castelhana, do comando do capitão Respenho, foi subjugado e tomada toda a artilharia, com que logo se começou a bater a grande fortaleza de São Filipe.

Foi restaurado em 1698, por ordem de D. Pedro II, e continuou durante o século XVIII bem provido e artilhado, tendo-lhe sido feita uma planta em 1772 que foi remetida com outras à Secretaria da Guerra. Durante a Regência (1830) foi também restaurado e serviu para alojar várias forças militares. No século XIX e até o início do século presente serviu para vários fins, entre outros para alojamento de baterias de artilharia (1914-18 e 1937-38), Lazareto, Posto de Desinfecção, Quartel General das Forças Aéreas Inglesas e Capitania do Porto de Angra do Heroísmo. Além de ser a primeira fortaleza marítima edificada na Ilha Terceira, é uma fortificação intimamente ligada com a tradição e passado do povo angrense, que a construiu com o seu dinheiro e com sacrifício e dela se serviu nas horas de perigo. Ao contrário do Castelo de São João Baptista, podemos dizer que foi construída por portugueses e para defender portugueses. Foi durante anos a única sentinela da cidade que inteiramente lhe confiava a sua defesa. Pedras venerandas onde os nossos maiores gravaram as armas nacionais e que se devem conservar e proteger para que os vindouros possam aproveitar a lição de patriotismo de seus avós. Manuel Baptista de Lima (inédito actualizado por Manuel Faria)

A pirataria aparece nos mares dos Açores logo nas primeiras décadas do século XVI, mas só pelos anos cinquenta surgiu fundado receio de que as acções de pilhagem pudessem atingir o próprio porto de Angra, na Ilha Terceira, então escala obrigatória nas viagens de retorno das Índias.

Simultaneamente com o artilhamento do Castelo de São Cristóvão (Memória), manifestamente inócuo na perspectiva defensiva da baía, Tomasso Benadetto, de Pesaro, traça, em 1567, o plano defensivo da ilha Terceira, nomeadamente da nóvel cidade de Angra. Peça fundamental desse plano, foi o Castelo de São Sebastião, vulgo Castelinho, cuja construção se terá iniciado em 1572, mas cujas obras já estariam suficientemente adiantadas em 1576 para ser-lhe atribuída alcaidaria. Torna-se o Castelo de São Sebastião, a partir dessa data, não apenas num reforço substancial do sistema defensivo anterior, mas no garante efectivo da segurança do porto oceânico de escala obrigatória das rotas marítimas intercontinentais. Graças a ele, a cidade pôde desenvolver-se e prosperar. Defesa tão eficaz que afasta a esquadra de D. Pedro de Valdez, em 1581, levando-o ao malogrado desembarque na Salga. Em 1582, chegado vencedor da batalha naval de Vila Franca do Campo contra a esquadra francesa enviada aos Açores em apoio da causa do Prior do Crato, o Marquês de Santa Cruz, ao serviço de Filipe II de Espanha, Filipe I de Portugal, não se atreve a acometer a cidade (nem a Ilha); e, no ano seguinte, é na baía das Mós que desembarca vitorioso, entrando em Angra pelo portão de São Bento, vedado que lhe fora o acesso por mar, pelo poder de fogo do Castelo de São Sebastião ? agora já secundado pelo forte de Santo António que Ciprião de Figueiredo mandara construir na ponta sudeste do Monte Brasil ?. E no Castelo de São Sebastião receberá a rendição formal das tropas francesas. Já sob o governo de espanhol Juan de Horbina, em 1589, o corsário inglês Francis Drake ? ascendido a sir pelas suas vitórias contra o império de Filipe II, nomeadamente, sobre a Armada Invencível ? vê frustrada a sua tentativa de saquear os navios carregados de importantes drogas, vindas das possessões ultramarinas surtos no porto de Angra, face à ameaça que o Castelo de São Sebastião representava. Em 1597, idêntico episódio acontece com o conde de Essex que sulca as nossas águas com cerca de 140 velas, e que impusera pesado saque à ilha do Faial.

O estabelecimento em Angra de uma guarnição espanhola se, como se vê, concitou maiores perigos para a cidade, reforçou, também, o valor estratégico da sua fortaleza. Logo nesse mesmo ano de 1583 se iniciam obras de melhoramento na Castelo de São Sebastião, com especial destaque para algumas instalações para homens e materiais, e para o reforço da frente voltada a terra onde a muralha era baixa e desprovida de qualquer sistema protector. Com efeito, a construção do Castelo de São Filipe do Monte Brasil nasce, essencialmente, da incapacidade física do Castelinho, desde o início vocacionado para a defesa marítima, de albergar e proteger os homens e os armamentos que o rei de Espanha queria colocar estrategicamente a meio caminho entre a Europa e as Américas. Mas a defesa específica do porto de Angra, essa continua confiada ao Castelo de São Sebastião, tal como reconhece um século depois o Padre Maldonado: este castelo é de notável importância, e tanto que dele depende a segurança da cidade enquanto ao mar. E como confirmam os acontecimentos ocorridos em 1641 e 1642. Perante os fundados receios de que, da parte dos terceirenses, pudesse vir um movimento restaurador com o consequente ataque ao Castelo de São Filipe, o governador espanhol diligenciou para que o Castelo de São Sebastião fosse demolido. Por temer que daí fosse atacado o Castelo de São Filipe? A questão estava ? e foi ? no controlo do porto de Angra. Primeiro, o curioso episódio da conquista do Castelinho pela companhia e pelas mulheres da Ribeirinha, com a ajudinha traiçoeira do artilheiro português ao serviço dos espanhóis, Caldeirão. Depois, as tentativas frustradas do governador estrangeiro, D. Álvaro de Viveiros, para enviar ao seu rei pedido de auxílio a partir do porto de Angra, e o desembarque aqui negado a reforços espanhóis, vindos em apoio dos citiados no Castelo de São Filipe. Com o Castelo de São Sebastião no centro de tudo isso!

A partir daí o Castelinho entra em declínio? Seguramente, não! (Ou tão só na medida em que o porto de Angra perde importância estratégica). No reinado de D. Pedro II, em 1698, importantes obras são efectuadas na Castelo de São Sebastião. Tão importantes que na lápide evocativa dessas obras, colocada sobre o portão, é usado o termo reedificar.

Em 1767, João Júdice, na revista que fez a todos os fortes da ilha, regista alguma ruína na fortaleza, não mais do que no Castelo de São João Baptista. É o reflexo do abandono a que a defesa militar dos Açores fora votada há muitas décadas. Como naquela data regista João Júdice, a artilharia que então por cá existia era exactamente a mesma e apenas a que os espanhóis haviam deixado em 1641... A guarnição do Castelo de São Sebastião era, então, dada pelo Castelo de São João Baptista, sob o comando de um capitão. Isto é, continuava a ter guarnição permanente. E o cargo de Capitão do Castelo era disputado, movendo influências na corte. Por este tempo o Castelo de São Sebastião terá sido objecto dos necessários melhoramentos, tal como parte da restante fortificação da ilha.

No final do século, a partir de 1797, é grande o temor de que os Açores possam ser atacados pelas tropas francesas. Numa situação de penúria extrema de armas e munições, o armamento do Castelo de São Sebastião sempre esteve nas preocupações dos responsáveis pela defesa da ilha. Ele continuava imprescindível para a defesa da cidade. Como imprescindível se mantinha em 1822, a crer na planta do sistema defensivo da baía de Angra, desenhada por José Carlos de Figueiredo.

Extraordinária relevância foi dada pelos liberais no sistema defensivo mantido para contrariar qualquer tentativa de desembarque das forças absolutistas (1828-1832). Foram executadas importantes obras na frente voltada ao mar com a construção da bateria da heroicidade; o Castelo teve governador próprio.

Com a saída das tropas liberais, ter-se-á dado início a um processo de degradação da fortaleza. Pelos anos cinquenta são propostas obras de restauro, mas uma relação de l862 já o dá em bom estado de conservação, o que significa que ainda valia como posição estratégica a contar na defesa do porto de Angra. E um relatório do Corpo de Engenharia, datado de 1868, informa que ele estava guarnecido, tal como o Castelo de São João Baptista, de que dependeria.

Insubstituível na defesa da baía de Angra durante três séculos, agente do desenvolvimento da cidade cosmopolita, o Castelinho foi, entretanto, testemunha e espaço de muitos episódios da vida social e política local e regional, servindo, nomeadamente de prisão a perseguidos pela justiça ou pelos poderes públicos, e de depósito de recrutas vindos das diversas ilhas do Arquipélago nas frequentes levas, nomeadamente, do século XVIII, enquanto aguardavam embarque para o Reino, para o Brasil ou para outras paragens lusas.

Quando em 1885 grassou em Espanha uma epidemia de cholera morbus e se receou, com justos motivos, que ela invadisse Portugal e pudesse chegar aos Açores, o Governo Civil do Distrito de Angra do Heroísmo pediu ao Ministério do Reino que obtivesse do Ministério da Guerra autorização para construir, no Castelo de São Sebastião, um lazareto, a fim de ali serem tratados, vigiados e saneados todos os indivíduos que chegassem à Ilha, vindos de portos suspeitos de tal epidemia. Não havendo razões que contrariassem esta pretensão, face ao clima de segurança militar que então se vivia no Arquipélago, foi ela satisfeita, e instalado o lazareto no terrapleno baixo ? Bateria da Heroicidade ?, com trânsito directo para o Porto das Pipas por uma pequena porta aberta na muralha.

Um relatório de 1887 regista o mau estado de conservação da fortaleza, propondo o seu encascamento e a reposição de pedras em falta nas raízes das muralhas.

Nos primeiros anos do passado século, a Junta Geral do Distrito de Angra do Heroísmo satisfazendo a uma necessidade há muito reclamada pelos povos deste distrito encomendou um projecto (1902) e deu início à construção (1904) de um Posto de Desinfecção Terrestre e Marítimo no Castelo de São Sebastião.

A localização deste posto no Castelinho foi bem escolhida. Destinado à desinfecção de pessoas, roupas, bagagens e mercadorias que por mar chegassem, ficava mesmo ali à mão, à saída do cais do Porto das Pipas; mas concebido, também, para responder ao frequente aparecimento e desenvolvimento na Terceira de doenças de carácter classificado de epidémico, tais como febre tifóide, meningite cérebro-espinal, difterias, varíola, tuberculose, escarlatina, carbúnculo, sarampo, situava-se à distância de isolamento necessária, relativamente ao aglomerado urbano de então.

Não foram, porém, pacíficas estas obras. Do projecto constava o rasgamento da muralha a Oeste, para acesso ao interior do forte, o que levou o Exército a pedir o embargo das obras. Reconhecendo que o Posto de Desinfecção era indispensável para a cidade e que o forte era o local adequado para a sua instalação enquanto razões de ordem defensiva não se sobrepusessem, o Exército opôs-se a alterações na estrutura arquitectónica, pelo seu grande valor como monumento histórico, valor este proveniente da sua antiguidade e dos feitos heroicos que a ele estão ligados.... De forma diversa se pronunciou o Presidente da Junta Geral de Angra do Heroísmo para quem o Castelo de São Sebastião [...] Como monumento histórico ou de arte é também de pouco valor, pois não possue obras de arquitectura que o recomendem, nem a ele se acham ligados factos da nossa história militar ou política que lho avolumem. E para acabar com as disputas, propunha a cedência definitiva da propriedade à Junta Geral.

A postura esclarecida e o prestígio do Exército venceram, e, por auto de cedência precária, de 10 de Julho de 1905, o Castelinho foi entregue à Junta Geral para conclusão das infraestruturas do Posto de Desinfecção, obras a todo o tempo removíveis, com reserva absoluta de intervenção nas muralhas ou outras obras defensivas sem prévia autorização do Exército.

Só em 1935 o castelo de São Sebastião voltou à posse do Exército. Por entretanto o Posto de Desinfecção ter sido transferido para outro local da cidade? Por necessidade de instalações do Exército na previsão de novo conflito armado? O estado lamentável em que se encontravam as instalações do Posto de Desinfecção, paralelamente com a construção de novas instalações algures na cidade, sugerem que se tratou da dispensa do Castelo para esse fim, por falta de condições. Não só, aliás, as instalações do Posto de Desinfecção estavam degradadas, mas toda a estrutura defensiva se encontrava profundamente arruinada, passado que fora mais de meio século sem que obras de manutenção fossem feitas.

Veio o Castelo de São Sebastião a acolher, sucessivamente, a Bateria de Artilharia de Defesa Móvel de Costa n.º 2, Depósito de Presos da Polícia de Vigilância e Defesa do Estado, Quartel das Forças Britânicas, 3.º BE do GACA n.º 1 da Base Aérea n.º 4, Serviço de Obras de Engenharia do Comando Militar da Terceira, e Capitania do Porto de Angra do Heroísmo, ocupante até há pouco.

Para além do Castelo de São Sebastião ter sido uma presença constante e interveniente em mais de quatro séculos de vida de Angra do Heroísmo, importante é, também, no plano arquitectónico, pela sua tipologia.

De que há conhecimento, a primeira fortificação erguida em Angra (e nos Açores), data da segunda metade do século XV: o Castelo dos Moinhos ou de São Cristóvão. Necessariamente ainda de concepção medieval, pouco conhecemos da sua arquitectura, por falta de representações iconográficas credíveis. Dos pequenos fortes que se lhe seguiram no perímetro da baía de Angra, também pouco sabemos, embora, aqui, estejamos em crer que as construções já seriam muito mais adequadas às necessidades defensivas contra o poder de fogo da artilharia dos navios hostis. Mas é com a construção do Castelo de São Sebastião que Angra é dotada de uma moderna fortificação, à altura das necessidades defensivas de uma cidade que passara a estar na confluência das grandes rotas marítimas intercontinentais. Para o projectar, veio a Angra, como se disse, Tomaso Benedetto, engenheiro italiano, da pátria de Leonardo da Vinci e dos mestres construtores de fortificações no século XVI, nomeadamente Tiburcio Spanochi, o projectista do Castelo de São João Baptista do Monte Brasil. As muralhas perdem a altura do castelo medieval e ganham a robustez necessária para contrariar o poder destrutivo da artilharia; as torres dão lugar a dois baluartes virados a terra, desenvolvendo-se duas ordens de baterias para o lado do mar. O interior é espaçoso, nele se erguendo até inícios do século passado, praticamente apenas a casa do Governador e a cisterna; ficando os alojamentos para o ajudante e a guarnição adossados aos baluartes; os próprios paios abriam-se sob o terrapleno dos baluartes. Com objectivos exclusivamente estratégicos, quanto menos edifícios comportasse, menor seria, logicamente, a destruição, em caso de ataque. Para além de ter sido concebido para ser guarnecido por ordenanças, gente do povo, com suas casas e família na cidade, que apenas ali permanecia o tempo necessário para prestar serviço. Um exemplar de excepção, pela tipologia e pelas ressonâncias históricas e sociais, do primeiro abaluartado nacional e da fortificação defensiva destas Ilhas.

Obras empreendidas pelos Monumentos Nacionais em meados dos anos noventa últimos, vieram reabilitar a antigo casa do governador e, parcialmente, o quartel do ajudante e caserna das praças. Por outras palavras, foram criadas as condições que permitiam o alojamento da Marinha nos edifícios tradicionais do forte, e a remoção das construções recentes, sem qualidade estética, e perturbadores da harmonia arquitectónica e funcional do sistema defensivo. O Castelinha podia assumir plenamente a sua natural função cultural e pedagógica. Só que, pela mão do Governo da Região Autónoma dos Açores e da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo, no interior é construída uma pousada, ficando do sistema defensivo do mais antigo edifício da cidade património mundial, referência monumental estruturante no processo da sua inclusão na lista de classificação da UNESCO, apenas as muralhas e os modestos alojamentos castrenses, reduzidos a mais valia ornamental do empreendimento turístico. Manuel Faria

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